Poemas pra pelada poética

Quando chegar a hora,

gostaria que minha morte

evocasse

uma tristeza alegre.

Não, o desespero amargo

das mortes que se confundem com tragédias,

nem júbilo,

como o fim dos que geraram ódios.

Morrerei feliz

se minha morte entremear doces lágrimas e sorrisos,

atestando que tudo esteja bem.

PSICOLOGIA DE UM VENCIDO

Augusto dos Anjos

Eu, filho do carbono e do amoníaco,

Monstro de escuridão e rutilância,

Sofro, desde a epigénesis da infância,

A influência má dos signos do zodíaco.

Profundissimamente hipocondríaco,

Este ambiente me causa repugnância...

Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia,

Que se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme — este operário de ruínas —

Que o sangue podre das carnificinas

Come, e à vida, em geral, declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê-los,

E há de deixar-me apenas os cabelos,

Na frialdade inorgânica da terra!

Poemas de uma coleção:

Um poema derramado docemente para enaltecer a musa

Quando você caminha descalça,

A onda branca se quebra na praia,

E as estrelas brilham no céu para emoldurar seu corpo;

Seus cabelos balançam com a brisa,

E seu sorriso ilumina a areia,

Enquanto os coqueiros que ondulam com o vento,

Assim como o mar e as estrelas

Compõem sua moldura.

E os meus versos se repetem como mantras,

Pobres, mas instilados por sua doçura,

Para revelar tudo o que importa no mundo:

Praia, vento, onda, coqueiros,

Céu luminoso repleto de estrelas,

Todo o universo existe apenas para te emoldurar.

Poemas de uma coleção:

Dois pedidos singelos, e um terceiro completamente insano

Súplica para uma musa

Vem ninfa, de pés no chão e cabelos ao vento,

Ondula seu corpo e enlouquece os poetas ao redor,

Alucina-nos com seu canto de sereia,

Enfeitiça nossos olhos, incendeia nossas mentes,

Pois é assim, musa,

Quando nos desorienta e ensandece,

Que nos transforma em poetas.

Um rogo comedido

Mas, se me enlouquece me envolvendo assim em sua magia,

Se me encanta e me cega para tudo o que não seja o seu rosto,

Permite então, minha musa, que o meu olhar se esvaia extasiado ao te mirar,

E que o meu canto te envolva suavemente como um beijo.

O pedido insano

Oh musa que me enfeitiça, que me enlouquece com o movimento mais sutil,

Que me alucina com um sorriso nem ao menos esboçado e apenas sugerido por um olhar,

Que me seca a boca e descompassa o peito, turbando o meu ritmo, minha paz, minha sanidade;

Vem, aproxima o seu rosto, para eu ver seus olhos, mirar seus lábios, tocar seu corpo, e num rompante apaixonado mergulhar em sua boca imergindo tão profundamente que a dissolução total me aniquile ou que o ar que você me rouba inunde novamente o meu peito trazendo-me de volta alguma gota de lucidez.

Poemas de uma coleção:

Cantos para uma musa (variações em torno de um tema)

Basta eu relembrar a sua imagem,

Para sua magia de musa

Me enlouquecer e transformar em poeta sedento,

Ávido, sôfrego, mendigando um olhar.

Ao te ver à distância,

Seu corpo ondulando enquanto caminha,

Minha imobilidade se torna suplício;

Queria me aproximar, tocar, falar,

Até que minhas palavras ganhassem braços

E saíssem de minha boca em forma de beijos,

Pois o feitiço que me transforma em poeta,

Também me inflama o desejo

E me rouba a razão.

Alumbrado, eu repito os versos que te faço,

seguidamente, como mantras,

Ou como beijos apaixonados que também sempre se sucedem.

Se eu me embrenhasse em seus cabelos,

Adentraria esse labirinto até me perder por completo,

Até não haver mais volta;

Penetraria em você até me diluir completamente,

Transformando-nos em um único corpo incandescente.

Poemas de uma coleção:

Poema para sussurros à meia luz

Deixa eu sussurrar uns versos ao seu ouvido,

Vagarosamente, entre suspiros,

Ao ritmo dos amores.

Enquanto minha voz sussurra,

Minhas mãos gritam

Buscando o seu corpo com avidez,

Tentando sentir seu calor, sorver sua pele,

Num clamor mudo, frenético e eloquente.

Quero mergulhar em seus olhos,

Em sua boca, {suspiro}

Minhas mãos puxam o seu corpo para perto de mim,

(Sou inteiro um brado silencioso;)

Oh ânsia absurda, oh desejo alucinado,

De estar em você, grudar, inserir, penetrar,

Até deixar de ser eu mesmo,

Abandonar a existência,

Me transformando em uma parte sua,

Como a perna que eu beijo,

Como o corpo que eu acaricio.

Vem, me engole, me suga, me engloba.

Meus dentes mordem sua nuca,

Minhas mãos vorazes sorvem seus seios,

Meus braços sôfregos envolvem seu corpo em glutoneria irrefreada.

Quero penetrá-la como em um labirinto,

Intrépido, confiante, mas sobretudo ávido,

Convicto de me perder para sempre,

De nunca mais conseguir voltar,

De me desorientar completamente,

De enlouquecer em seus braços,

Entre suas pernas,

De me perder em seu corpo.

Sente o meu queixo arranhar seu pescoço,

Minhas coxas comprimindo as suas, e o meu abraço apertado,

Ouve o meu urro, seguido das carícias suaves e ternas sob o ritmo forte de meu coração se alinhando ao seu.

Poemas de uma coleção:

Convite à loucura

Não pedirei um beijo de sua boca que eu tanto desejo,

Nem suplicarei um abraço (oh, como sou insano!)

Também não clamarei pelas doces carícias que sucedem abraços e beijos,

Mas quererei seus olhos.

Quero mergulhar em seus olhos alucinadamente,

Hipnoticamente,

Adentrar sua alma,

Dissolvermo-nos em um só, loucamente.

Seja o mar em que eu mergulho,

As águas em que imerjo,

Minha loucura, minha paz.

Seja a minha Deusa,

O meu mundo,

Seja tudo o que existe.

Poemas de uma coleção:

Um cântico desesperançado

Não pronunciei os poemas para sussurros a meia luz,

Teriam permanecido inauditos,

Inertes, torpes como passarinhos em um gráfico,

Expostos em uma folha de papel, sem movimento,

Sem vida e sem graça como folhas secas jogadas ao sabor do vento,

Nem vi a luz de teus olhos enquanto lia os versos que te fiz.

Eu te olhava à distância, lendo os poemas que nunca te narrei,

E sonhava com um beijo;

Quantas vezes sonhei com um beijo teu.

Não o disse com palavras de minha boca,

Nem com as que escrevi em papel,

Mas sonhava com o beijo enquanto me derramava por ele ao te escrever.

Tua imagem me transporta a um delírio doce,

Suave, mas intangível,

Distante como uma canção se desvanecendo ao longe,

Cada vez mais longe.

Os versos murchos e tristes que hoje te escrevo,

Vazios, desesperançados,

São acenos de adeus

Que te faço ao tentar libertar minha alma.

Segue com eles um beijo apaixonado.

Poesia da lua

Houve um tempo muito distante

Em que o céu era claro e límpido.

Da lua jorrava poesia

Refletindo em lagos e mares

Exalando de meigas virgens

Cobrindo campos e pastagens

Transbordando por toda a Terra.

Nesse tempo remoto e doce

Em que a poesia transbordante

Ameaçava inundar a Terra

Era necessário contê-la

Amarrando-a entre rimas

Cerceando-a entre métricas

Prendendo-a entre mil normas.

Mas então se encobriu o céu

De fumaça letal e densa

E a poesia vinda da lua

Desapareceu, simplesmente.

Não eram tempos de miséria

Nem havia fome na época

Havia até muita comida.

Não eram tempos mais sangrentos

Que os de outras tantas batalhas

Havia de tudo um pouquinho

Só não havia mais poesia

Que aos poucos definhou, secou

Morreu.

Gustavo Gollo

dos Anjos
Enviado por Gustavo Gollo em 15/12/2021
Reeditado em 14/09/2022
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