Acidente
No momento em que recobrei os sentidos me veio uma urgência e uma calma.
Urgência de saber se todos estavam bem, de ser logo atendido, de ver aquela cena resolvida de algum modo.
Mas também a calma.
E ela se impôs e ficou. Uma paciência que em mais de quatro décadas eu desconhecia.
Qualquer resquício de pressa foi se dissipando.
“Tudo vai se ajeitar”. Não era uma voz que dizia isso, era a vida mesma pulsando em torno a mim, dentro de mim.
“O principal é estar vivo! O resto se encaminha”. Era uma antecipação de velhice, aquela ponta de sabedoria que só tem quem já viveu muito. E me foi dada uma gotinha de presente naquele instante.
Depois que ela, a calma, se apossou de mim, tudo o mais veio vindo com serenidade. O hospital, as dores, os exames, os remédios, as mil idas a consultórios.
Difícil? Imagina. Nada de difícil. Apenas a vida na sua dinâmica própria. Momentos de leveza, momentos de exigência aguda.
Alguns dias depois, da varanda da minha casa, eis que vejo ele: o sol se pondo atrás da serra.
Ah! Era a “alta” que meu espírito aguardava. No prontuário, veio escrito: “Renascido aos 46 anos. Está apto a começar a viver de novo. Recomenda-se o máximo de atenção para captar cada instante da imensurável aventura da existência”.
Tenho seguido a prescrição médica.