O QUASE ARCO-ÍRIS É FATAL

Onde Esse tecido destino errou a mão
para este homem que agora vejo
de bandeja nos braços
a vender pasteis de farinha e tristeza
tem sandálias surradas esse homem
que vende pastéis de farinha e solidão
sandálias roídas pelas bordas
que história triste leio nestas sandálias
do homem que vende pastéis de farinha e poeira
no semáforo quase arco-íris
com seus três olhos míopes

tem setenta e cinco anos de cicatrizes
arrasta as sandálias costuradas com barbante
quando o olho vermelho
abre os pulmões por trinta segundos
se refletindo nas películas
nem se dá conta o homem deformado
que oferece a si mesmo
- Você quer comprar meus pastéis de farinha e lágrimas?
humilhantemente diz a humílima voz que não sabe mais chorar

onde se arruinaram as horas do seu sossego
ofende-lhe agora o olho verde
rindo de sua penúria
espera homem de setenta e cinco cicatrizes
há corcéis alados querendo passar

eu queria uma rede para o homem embalar suas setenta e cinco cicatrizes
eu desejo uma cama
uma alpercata de plumas
um travesseiro de algodão da samaúma
para este homem reclinar o coração levemente
e reaprender a chorar
lamber despreocupado suas lembranças
sonhos que um dia fez

agora cospe no seu rosto
o olho amarelo um riso dissimulado
e avisa
vá homem vestido de setenta e cinco cicatrizes
vá com suas sandálias rachadas como o chão no tempo da seca
vá logo cuidar de sua vida
vá vender seus pasteis de farinha e morte

Edmir CARVALHO BEZERRA
Enviado por Edmir CARVALHO BEZERRA em 22/11/2005
Código do texto: T74640