UM FIM DOS DIAS

Nu gesto em desespero ao vento

No caminho das pedras que choram –

Já é março, sepultemos sonhos

Após as novas do silêncio.

Esse sol despótico é temático,

O fundo opressivo.

O agora é um rei que se retira,

É o cinza e o silêncio do remorso.

Propomos a farsa conveniente

À vergonha em trono vazio –

Eis o cetro dum pobre monarca

Que não voltará.

Despedidas, velhas agendas

E o resíduo dos verões vencidos

No imprevisível chão de durar.

Somos como quem despertou

Há pouco e não sabe se ainda sonha

Na alheia manhã.

Ergueremos a voz, errantes

No louco itinerário da dor

Que nada sabe, que nada sabe...

Exceto o nosso nome gasto.

Inauguramos um fim dos dias

Sem paz ou orgulho.

Somos a sombra duma ideia

Que não serve mais, não serve mais...

Personagem ao qual falte enredo,

Esboço ou rasura imprestável.

Constrangidos? Impotentes? Vis?

Quase isso, se tanto.

Há pesadelos sempre à espreita

Em cada logradouro aturdido –

Todos os caminhos sem retorno...

Se o dia engendra despedidas

É nas deixas cretinas que vamos

Ferindo o destino.

Seremos nós sob os vitrais

Da grande catedral soberana?

Confessaremos nossa penúria

Ao sóbrio pardal diligente

Por esses atalhos esquecidos,

Por becos e praças.

Solidão de abismo, esperemos...

Temos um testemunho do mármore

Corroborando razões na dor.

Oh, destra a balbuciar encantos,

Torpe feiticeira entre os portentos

À luz que ainda resta.

.

Israel Rozário
Enviado por Israel Rozário em 13/03/2022
Código do texto: T7471588
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2022. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.