O poema errado

O POEMA ERRADO

Penetra surdamente no reino das palavras.

Lá estão os poemas que esperam ser escritos.

Drummond

Vou ao reino das palavras com a tranquilidade de quem trouxe de lá uma ou duas páginas valorosas. São minha permissão. Entro quando quero, extraio as palavras de onde repousam em estado de dicionário, e as acomodo para viagem na forma de poemas perfeitos. Todos se corrompem na passagem, alguns irremediavelmente. É por esse motivo que tantas linhas imprecisas são escritas. Tenho impulsos de retornar ao reino das palavras e vasculhar incansavelmente pelo poema certo. Ele ainda está lá. Mas desse já não tenho a chave, e ninguém mais a poderá ter. Perdeu-se. Olho para o poema embaralhado que possuo, sentenciado à inexistência, e me compadeço do seu destino. Sorrio. A inexistência é uma condenação impossível.

O poema errado

Com a vida diante dos olhos

Escrevi minha história

Manchei os campos com meus passos

Maculei a água com minha sede

Julguei merecer que me sorrissem

Um sorriso puro e ingênuo

Que já não sorri sem tristeza

Fui amado com um amor perfeito

Que hoje tem a marca da minha estupidez

Quisera ter entendido o que é ser humano

O que é ser imperfeito

Quisera ter entendido o propósito de todas as coisas

Segundo o qual nada existe em vão

Não se vive sem culpa

Mas não se existe sem razão

Se em tudo eu tivesse errado

Não choraria por não ter tocado

A flor que deixei morrer no jardim

A flor não temia a morte

A vida era o seu fim

Carlos Alberto Silva
Enviado por Carlos Alberto Silva em 10/06/2022
Código do texto: T7535141
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