Sobre o século que tornou inevitável tudo o que poderia ser evitado.
O homem ao meu lado cantarola uma canção dos anos 40.
Anos de guerra na canção do homem.
Nessa hora eu o lastimo, eu o invejo.
Pensando bem, sinto acima de tudo curiosidade,
essa idéia tola de querer tentar, com os olhos da mente,
supor de que foram formados os milênios
que precederam o meu relapso de existência.
O homem viveu o século XX.
E viu com olhos vivos
e gritou gritos rouquentos
e chorou morte de povo...
Povo mesmo, não elite.
E talvez tenha sangrado, literalmente e/ou figurado
na tal da ditadura de que eu
tanto ouvir falar.
Eu não o conheço.
Suponho tudo quanto falo...
Mas é que a gente tem mania de criar na figura do outro
a imagem que a gente quer.
Falando bem mesmo, ele tem cara de brasileiro.
Digo, brasileiro de dar o sangue, sabe?
Daqueles fanáticos ou similar.
Ufânico, como já diziam os modernistas.
Cara de quem se alienou na copa de 70 e gritou
"Médici"
E condenou aquele bando de estudantes
desocupados que foram parar na Amazônia
buscando a tal da anarquia.
Mas ele viveu tudo isso.
Ou poderia ter vivido.
Nasceu no momento certo, pra ver tudo
de errado que aconteceu.