Pingo de saudade

Em preto e branco/

Se apresentava na passagem/

Veio trazendo despejo na bagagem/

Mas enquanto viveu/

Entre o amor e a raiva/

Se dividia com graça e maestria/

Não era popular/

Entre a freguesia/

Mas não era de se encabular/

Quando alguém chegava/

Ele logo se apresentava/

Quando conhecido festejava/

Quando não esbravejava/

Aqui e ali sozinho/

Fez de uma gata sua amiga passageira/

Brincavam a encantar/

Assim como brigavam a se filmar/

Dias a dias nos cativava/

Gostava de subir e descer a escada/

Não por acaso/

Gostava mesmo de estar em nossa companhia/

Por anos nós serviu/

E com certeza sentiu/

Nos seus últimos dias/

Apesar do temperamento animal/

O amor que sempre nos uniu/

E desde que desse mundo partiu/

Na casa ficou um imenso vazio/

A gata pranteava/

Minha mãe não se acostumava/

E eu era só olhar para os cantos costumeiros/

Onde ele ficava/

Que as lágrimas vinham consolar/

Tentar ouvir no silêncio de qualquer hora/

Os latidos que nos deixaram órfãos/

É como lembrar do quanto ele lutou/

Acreditando por seu olhar de despedida/

Que ainda teria muita vida/

Muita entrega para cuidar/

Mas nessa curta caminhada/

Vale lembrar/

O quanto um pingo de chuva/

Pode molhar a vida toda/

Homenagem ao nosso companheiro e amigo fiel Pingo.