FÓSFORO MOLHADO

inocente eu seria se não soubesse

mas sei

de mim não posso tirar a carga

das coisas que não se esquece

foi como pensei

essa deve ser a mais amarga

aperto contra o peito uma carteira de cigarros

como quem se agarra a um rosário

e faz uma prece urgente

me escondo entre os carros

esse aperto no peito faz aniversário

dou-lhe o resto do corpo de presente

cigarro nos lábios não tenho o que o acenda

chove fraco mas suficiente para embaçar a vista

um homem de terno cobrindo a cabeça com jornal se aproxima

falo devagar para que ele me entenda

ele sorri com olhos serenos, quase batistas

me entrega uma caixa de fósforos molhados e desaparece na esquina