PROCURA

Abro a primeira, a segunda, a terceira gaveta

Estou à procura de mim entre vestidos e meias, além das peças

Além das roupas ocas, eu à procura de mim.

Leio a primeira, a segunda, a última poesia

Em que eu, a velha poetisa, cria?

Estou à procura das crenças entre versos e rimas e estrofes,

além da forma e do estilo

Intimada e contida no verso, eu à procura da crença.

Tateio uma, duas, as quatro paredes à procura da porta

Abstraio-me no gesto, subtraio-me na vergonha de não encontrá-la,

No escuro me testo

No escuro, a testa na parede e a dor de acertá-la

Eu torta, a vida torta.

Nada de porta.

Digito uma, duas, cento e trinta palavras

E nelas me lavro.

Nelas, lavo-me.

Vou-me nelas.

Singelas ou não.

Estou à procura de mim, mas no silêncio não me acho;

mas no verso não me encontro;

Se me calo, se falo ou se escrevo,

Procuro-me.

Não estou no silêncio, não estou no verso, não estou em mim

Nas gavetas, nada

Nos quintais, idem

Na infinidade, tudo – mas não eu.

Afastei-me da poesia, mas foi à procura de mim.

Não me encontrei, voltei e fiz meu verso

No verso, tentei encontrar-me do início ao fim.

Fabiana Alves
Enviado por Fabiana Alves em 06/01/2023
Reeditado em 06/01/2023
Código do texto: T7687909
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