Av. Atlântica
Copacabana esta noite
É a minha Atenas, meu Nilo,
Minha Montmartre...
A noite perfumada
Soprava a silhueta
De seu vestido azul.
Tomou-me pelas mãos:
Olhos de anjo, sorriso doce.
E horizonte farto
De talentos e imaginação.
Primeira rodada de Vermout
Com uma cereja que pediu
(Não na borda decorada,
Mas solitária no fundo da taça)
Falou dos anos de fúria.
De Renoir e da nudez crua.
Falou das paixões viscosas
E seus casos, dezenas...
Fatalmente sem destino.
Eram uns olhos negros
Intranslúcidos
Que me atraiam fixos
Para um pescoço delicado.
Enquanto me olhava
Tentava espetar
A cereja da taça
E com o mesmo palito,
Ainda doce, ainda fresco
Espetou meu peito
como Afrodite ingênua...
E eu não consigo sentir dor,
Nem se metesse um murro
Na cara e me quebrasse
Os dentes da boca.
- Não consigo.
Nessa montmartre, nesse Nilo,
Nessa Copa perfumada e escura
Sou um pierrot banido
Esperando suas ordens,
Esperando a saliva e o toque
Dessa sua taça vazia.
***