Escrava

Querem remediar-me a alma,

Dizem-me partida, quebrada.

Doses de tira-dores,

Que calam meu sofrimento.

Mas se calam meu sofrimento,

Como gritará a poesia?

Querem costurar-me inteira

Dizem que estou despedaçada,

Prometeram remendar –me os pedaços.

Costurar minha alma.

Mas se me remendam

Por que brecha passará a luz da poesia?

Querem colar meu cacos

Dizem-me estilhaçada

Ligas para quem liga.

Cola para quem me cola.

Mas se me fecham toda,

Por onde escorrerá a poesia que jorra por minhas frestas?

Se me consertam também me matam.

Se me salvam, assim me perdem.

Se não escrevo é quando morro.

Sou da poesia, escrava.

E por ela, todo padecer, é flor.