Dois poemas de uma moça que não sei por onde anda...
No ano de 1980, iniciei uma aventura como Auxiliar de Enfermagem, no Hospital Nossa Senhora das Graças, em Sete Lagoas. No setor em que trabalhava, havia uma moça tímida e tristonha, que atuava no área de limpeza. Nas poucas vezes em que se abriu comigo, revelou que gostava de escrever poemas. Entusiasta, desde aquele tempo, pedi que me mostrasse seus trabalhos. Ela relutou em fazê-lo, mas compartilhou comigo dois ou três poemas de sua autoria. Fiquei encantado com o que li e, chegando em casa, datilografei aqueles manuscritos.
Os anos se passaram, e nunca mais vi aquele moça, Gislene, o nome dela. Não sei que rumo tomou na vida, mas os seus poemas ficaram esquecidos, em meio a tantos papeis que tenho a mania de guardar.
Hoje, por acaso, encontrei a página datilografada por mim, há mais de quarenta anos, e decidi digitá-los para partilhar, com todos vocês aqui do Recanto, os sentimentos daquela moça poeta que não sei por onde anda, nem mesmo se ainda está viva.
Seguem abaixo os dois poemas que recuperei da amarelecida folha guardada por tantos anos.
Quem sou
Quem sou eu
Para merecer um sorriso seu?
Quem sou eu
Para merecer você?
Quem sou eu
Para chegar até você?
Para viver em seu olhar?
Quem sou eu
Para seguir com você
Em seu caminhar?
Sou quase nada,
Em sua vida que tem tudo
Sou só amor,
Profundo, forte e mudo!
Sou só tristeza,
Em sua felicidade!
Sou toda você e saudade...
Eu sou o nada
Que lhe quer muito,
Você é o muito
Que não me quer nada!
Você o tudo que me faz
amar-lhe tanto, tanto;
Eu, o nada
Se desfazendo em pranto.
***
Sou eu
Sou folha levada ao vento,
Deixada à margem da estrada.
Sou pranto silencioso,
Sou uma mágoa calada.
Sou a fonte de água pura,
clamando amor e carinho,
pedindo paz e ternura!
Sou um grãozinho de areia,
perdido pelo deserto
sou tu que estás muito longe
E quantas vezes tão perto!
Sou chama quase apagada,
Ao leve soprar do vento!
Aquele nada no mundo
Desfazendo-se no tempo.
Sou também ave sem ninho,
Buscando a felicidade!
E aquela triste estrelinha
Fulgindo a luz da saudade.
Sem graça no imenso céu.
Sou um barco em noite fria
Navegando, em vão, ao léu
na sofrida escuridão.
Sou um espectro de gente
Gemendo na solidão.