LUGAR COMUM — sou —
Sou uma longa história,
um livro surrado de pó
em cima, este intervalo
vazio (capa a contracapa).
Sou quem ficou amarrado
por conta da língua afiada,
lá no tronco com o chicote
cantando alto, golpe a golpe.
Sou quem tem boca e arrota,
jamais fui o velho cuja sorte
matará de seguro, pois a vala
que será minha já está cavada.
Não trato como eu sou tratado,
penso mesmo dentro das caixas,
e tudo o que não parece é a sobra
dalguma coisa que agora é morta.
Sou o último que menos importa,
não semeio o lírio que desabrocha,
nasço feito espinho: venho do caule,
o lugar comum, o anjo da obviedade.
Sou aquele ruim desde os primórdios.
A luz sem túnel. A dor entre os miolos.