o vale que vale
O destino é essa pedra, firme e angular.
Até onde? Os olhos não decifram
essa textura, ou a cor da lâmina mais densa.
Pedra que não a forja das mãos,
nem a ambição imperiosa. Pedra,
destino também, impenetrável, inviolável.
Pedra de ferro, tosca, na forja do tempo,
estranha, preciosa, diamante.
Para ela, nada deve, não é desse
valor que move mercados, sem valor,
mas quem não a enxerga, digamos: coitado,
é dela a sombra que o sol declara, a chuva
que os céus lhe abençoam, céu e terra
traçam com ela a mesma trama. Pedra
que não rola, é dela essa ladeira que por agora
se estanca, tragédia que a fez surgir,
ou um cálculo matemático? Sou ela e sou dela,
a quem coração não balança, vísceras
não explodem. A pedra é vida, pedra e pedra,
nela estão todos os vales, inclusive aqueles que nada
vale
Ela mesma nada sabe, salvo quando são
nossos olhos as absorve
---------------------------------------
No inverno, o mundo suspende seu girar,
Fogo, ruas, parede e vale, as flores,
Numa pausa sem conta, o sangue denso e pesado,
Domina o espirro das águas, o coração,
Se agita, seu pulsar abafado, alguém ama
Na trama abatida do gelo, e crianças forjam lembranças
Que as levam a quadros requintados, infantes à beira de praias
De sabores únicos, trazem contos campestres, de amores, uma
Vida iluminada entre eles, penso que a rua, destino certo,
Engole os fatos, nos arrasta, menos os olhos para um canto,
Segredo velado, as mãos perfumadas, não, tédio, máquina emperrada
De signos, engrenagens do desperdício, surge uma moça na morada,
Amiga de outra amiga, pergunta por um cobertor, desconhecida,
Apenas sua pele nos ensina, e seus lábios animam, no quarto
Mais sombrio a encontraria, sua pele clara como lâmpada,
Instantes, sua presença nos evoca, abrimos os livros e lemos
Que a cidade inteira balança, toda exausta, desvendo o aposento,
O cobertor desenha uma flor, tal girassol, ofereço-lhe um espaço
Na poltrona, é o frio invernal que nos abraça com seu abraço.