o vale que vale

O destino é essa pedra, firme e angular.

Até onde? Os olhos não decifram

essa textura, ou a cor da lâmina mais densa.

Pedra que não a forja das mãos,

nem a ambição imperiosa. Pedra,

destino também, impenetrável, inviolável.

Pedra de ferro, tosca, na forja do tempo,

estranha, preciosa, diamante.

Para ela, nada deve, não é desse

valor que move mercados, sem valor,

mas quem não a enxerga, digamos: coitado,

é dela a sombra que o sol declara, a chuva

que os céus lhe abençoam, céu e terra

traçam com ela a mesma trama. Pedra

que não rola, é dela essa ladeira que por agora

se estanca, tragédia que a fez surgir,

ou um cálculo matemático? Sou ela e sou dela,

a quem coração não balança, vísceras

não explodem. A pedra é vida, pedra e pedra,

nela estão todos os vales, inclusive aqueles que nada

vale

Ela mesma nada sabe, salvo quando são

nossos olhos as absorve

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No inverno, o mundo suspende seu girar,

Fogo, ruas, parede e vale, as flores,

Numa pausa sem conta, o sangue denso e pesado,

Domina o espirro das águas, o coração,

Se agita, seu pulsar abafado, alguém ama

Na trama abatida do gelo, e crianças forjam lembranças

Que as levam a quadros requintados, infantes à beira de praias

De sabores únicos, trazem contos campestres, de amores, uma

Vida iluminada entre eles, penso que a rua, destino certo,

Engole os fatos, nos arrasta, menos os olhos para um canto,

Segredo velado, as mãos perfumadas, não, tédio, máquina emperrada

De signos, engrenagens do desperdício, surge uma moça na morada,

Amiga de outra amiga, pergunta por um cobertor, desconhecida,

Apenas sua pele nos ensina, e seus lábios animam, no quarto

Mais sombrio a encontraria, sua pele clara como lâmpada,

Instantes, sua presença nos evoca, abrimos os livros e lemos

Que a cidade inteira balança, toda exausta, desvendo o aposento,

O cobertor desenha uma flor, tal girassol, ofereço-lhe um espaço

Na poltrona, é o frio invernal que nos abraça com seu abraço.