Amor Guajará

Vagando sem destino/

Fui bater no teu quintal/

A sombra da janela/

Instigou-me a um brilho/

Intensamente fatal/

Qual tirou-me da alma o sossego capital/

O teu rosto há anos repousava a capela/

Vendo a chuva no horizonte/

Desriçar no colo da palmeira/

Enquanto as ondas do Guajará/

Espraiavam na beira/

Levando uma brisa a farfalhar /

Silêncio no cantar do sabiá/

Por trás das folhas da mangueira/

Sem me conter/

Mas a esconder/

Saindo de mim/

Disse assim/

Ei menina da janela/

Só prá te tirar o fôlego/

Daquele infinito vão/

Que nesse entreveio/

Fez-te surtar a beira do regato/

Sob efeito do desejo/

De querer saber/

Quem onsava de longe/

Despertar o teu querer/

Acordada acendeste os olhos , como a procurar/

Na fumaça do fogo o crepitar das lenhas/

Aquecendo o lugar/

Sem ainda encontrar/

Por detrás da mata/

Te via banhar aquele corpo/

Terra fértil a se preparar/

Te vi olhar as águas calmas/

Com frio nos seios/

E desejo ardente nos lábios/

Parece que a pensar/

Será, que foi boto sinhá/

No primeiro instante/

Como relance/

Passou algo daqui/

Com o que veio dali/

Não dava ainda pra identificar/

Com os pés no chão/

Saindo da rede/

Pra arredar o alguidar/

Tucupi com jambú/

Espalhou na goma com pimenta/

Ardendo a rodopiar no ar/

Com suas vestes floridas/

Seu cheiro de mato sobressaiu/

A me mundiar/

Mexendo com minha cabeça/

A me apaixonar/

Como o a mãe d água/

A me chamar/

Enquanto a lua deserta/

Sob a maresia a desenhá-la/

Nas rupturas das ondas do mar/

Dançava embriagada sem querer parar/

Tomada pela cachaça/

Da noite que se agasalhava/

Querendo, querendo o amor vingar/

Atiçando vorazmente/

O barulho de pesca a se soltar/

Teimou, teimou em de novo apelar/

Então ao se aproximar/

Da nuca e pescoço /

Puxando os cabelos negros/

Foi logo sussurrando aos ouvidos/

Escorrendo os dedos pra infligir o medo/

Ser tomada da sanidade/

Dizendo a flor das horas/

Menina, senhora eu quero te amar/

Que de súbito ouviu vaga-lumes/

No escuro dos costumes/

Fazê-la endoidar/

Virou-se, a modo de olhar/

Entre feiras cabanas e tajás/

Com laço de patcholin nas mãos a apertar/

Sangrava de vontade/

De querer ali deitar/

Nos vimos de frente/

Com as bocas coçando/

Com as bocas roçando/

Sob o gosto cupu bacuri/

Todo melado de açaí/

Procurando sob aquele cio beijar/

Abraçando profanamente profundo/

A cada pele da carne trêmula tatuar/

Sob a égide de uma antiga fome/

Além do entendimento do mundo em volta/

Tão viciante era o mel/

Que cativo dos sentimentos/

Aquele momento os fez herdar/

Toda a fantasia que permeia/

As ruas dessa Belém do Pará/