TEMPO NUBLADO (5)

MURALHA

Lembranças,

sorrisos deixados para atrás.

Meu passado é o ópio do presente que eu vivo.

Minha vida é transgredir

o ego alheio.

Por isso anseio,

e não subo a muralha do meu desejo,

tenho medo,

por um instante de ilusão contínua,

por falta de amigo,

um sorriso ambíguo.

Abro minhas asas nessa alucinação,

encontro meus sonhos distantes

sempre em contradição.

O efeito passa,

mas a toxina que me faz viver

um dia acaba.

E certamente, as lembranças e os sorrisos

morrerão junto a mim.

CAMINHOS DIFERENTES

Seguimos essa nossa vida

de caminhos diferentes,

mas, com as mãos unidas,

sonhamos com a mesma felicidade

de caminhos diferentes.

Com a esperança unida,

cada qual com um destino,

mas, no mesmo mundo cretino,

nossos caminhos são diferentes.

Com sentidos ortodoxos,

nosso pensamento

está longe,

mas os corações estão próximos.

PARALELO

Verte o sangue

da ferida.

Foge de mim

a vida.

Da nuvem cai a linfa

que transborda euforia.

De mim caem lágrimas

que escorrem

vazias

neste lacônico paralelo

que o medo lacrou.

A decadência afluente me sugou.

Grassa-se a praga

de tão horrível chaga

que, expondo-se na garoa do mal,

o vácuo de existir

degrada meu amor

nas últimas batidas

do meu coração.

SEM VITAMINA

Foi tomando Coca-Cola,

assim, tantas vezes

em minha vida,

afogando minhas mágoas

toda vez que me sentia ferida,

segui minha lira.

Se hoje sou fraca

e, por conseguinte, sofrida,

é porque as Cocas

que tomei

nada valiam...

TREM DA VIDA

Embarquei no trem chamado Destino

para encontrar a vida.

Parei na Estação Sofrimento.

Depois de uma despedida,

o trem Destino deixou-me nessa Estação.

Nela permaneci, sem amor no coração.

Passaram-se os anos...

Juntaram-se os enganos

e, quase no meu fim,

o Destino, trem atrasado, que jurou voltar,

veio feliz me buscar.

Porém, no trem não havia mais lugar,

contudo, mesmo assim, fui em pé,

amparando-me no corrimão.

Passei pela Estação Angústia e depois Estação Desilusão.

E, por entre estas...

Cheguei à Morte.

Durante toda a viagem

não cheguei ao meu objetivo.

O trem chamado Destino

não foi meu amigo. Não passou na Estação Esperança nem na Estação Felicidade.

Perdi o tempo com algo que não foi verdade.

Quando só, na Estação Morte, depois de avistar uma luz incandescente,

fui realmente

feliz, e cá dentro dessa luz

encontrei a vida.

ELAINE BORGHI

primavera de 2005