fundo do rio

Descendo o rio, o mais doce dos veios,

Encontro grãos de sombra desmemoriados pela corrente.

Dias e noites entrelaçam-se em celeste dança,

Marcados a estrelas por uma vida que os prenuncia,

Mas é na câmara escura das águas,

Onde elas beijam a pedra, que jaz um querer mudo,

Um desejo que, mergulhando no abismo, se perde de si em linguagem.

Através do espelho líquido nos vemos,

Somos água, somos fluidez, na camada onde o encanto se esvai,

Onde o ser não se ilumina pela experiência,

Mortos em vida, respiração contrariada,

Mais íntimos das pedras do que das flores,

E o céu, uma escada de prata, exclui-nos,

Costurados ao mundo como fragmentos dispersos.