MEU FILHO AUTISTA
Meu filho me morde
Quando tem fome ou dor.
Mas não é uma fome qualquer
Que qualquer alimento a sacie.
É uma fome indecifrável
A marcar meu corpo,
Com seus dentes frágeis.
E não é uma dor qualquer,
Que um remédio alivie.
É uma dor que me ameaça,
Por não saber curá-la,
Uma dor que me comove
E move, em meus olhos,
Lágrimas impotentes.
E depois, em seus lábios inocentes,
Abre-se um sorriso daqueles
Que só uma criança sabe sorrir,
Com seu olhar sorrindo também.
E eu, como mãe, observo-o feliz
Por tê-lo assim, agora alegre.
Mas triste, por tão incompreensível,
Fazer-me mistérios de seu ser.
Meu filho me morde de arte,
Espelha-me a insensatez
De nossa sorte.
Livra-me das convenções
De vida ou morte.
Meu filho autista
Dá-me o mote
À ilusão de artista.