A LOUSA E A CRUZ

Lá no alto da ribeira,

suspensa, uma cruz caiada

faz sombra à lousa gessada

onde repousa meu pai.

É onde velha mangueira

carrega fruta rosada,

é lá que minh'alma inteira

chorando por noites vai...

Lá se encontram cotovias,

as rolas formam casais,

faço lá verter poesia

e espero todos os dias

que os dias me esperem mais.

Quero ver flor na videira

e sonhar entre os florais,

mas lá a mimh'alma inteira

chorando por noites vai.

Bebo as águas da ribeira

jaspeadas pelo lamento

e sobre a lousa na poeira

abro o verso de um poema

que guardo por muito tempo:

"Basta cobrir-me, não tema."

Desço a mansa da ribeira

numa prece por meu pai

e é lá que minh'alma inteira

chorando por noites vai.