Vida no sertão
Do romper da aurora
Ao ocaso solar
Sempre estou pronto como agora
Para tudo fazer e praticar.
Sou sertanejo, nascido lá nas brenhas do sertão
Ali onde o sol é farto e muito abrasador
Pois em todo o Brasil tem seu quente verão
E em qualquer rincão tem “cabra” bom e trabalhador.
É ali no nosso sertão que tudo é mais complicado
Onde a gente tem que aprender e logo tudo fazer
Mesmo que seja muito arriscado
Mas é de menino que se começa a aprender.
Ou logo tudo se aprende
Ou nada se faz
E se nada se vende
Dinheiro não traz.
A gente nunca nasce sabendo
Mas sempre cresce aprendendo
E se envelhece fazendo
Porém só se aprende querendo.
Hoje, quase tudo eu me ponha a fazer
Ou se faz ou se compra muito caro
E o que pratico começo e termino com prazer
E faço produto durável e muito raro.
Também vendo no atacado e no varejo
Sempre faço mais pra vender
O trabalho é a minha fonte de dinheiro
E de sol-a-sol tenho o que fazer.
Construo e conserto qualquer quebrado
Mas na agricultura também sei cultivar
Conserto todo usado ou mal acabado
O que nunca fico é sem trabalhar.
Trabalho dentro ou longe de casa
Seja trabalho leve ou pesado
Todo serviço é uma boa causa
Não se pode perder nenhum trocado.
Vivo como bicicleta, se parar caio
Se estou parado procuro algo exercer
Se fico cansado do repouso logo saio
E sempre tem coisa nova para fazer.
De tudo sei fazer um pouco
O que é bom aprendi com meu pai
Mas não sou um santo do pau oco
Faço tudo ligeiro e comigo ninguém vai.
Roupa, terno e sapato tudo eu conserto
Sou tropeiro, vaqueiro e corro em prado
Se sou procurado é porque faço certo
Amanso cavalo, jegue e até burro brabo.
Sei arar, gradear e com trator cultivar
Faço gamela, pilão de madeira e de pedra tosca
Fabrico barco, jangada e caçoeira pra pescar
Construo forno de tijolo pra assar grude e rosca.
Tapioca, biju é bom pra comer e gosto de fazer
Farinha eu sei torrar e goma preparar
Charrete e carro de boi eu sei tanger
Broco, arranco o toco e a folha sei incorporar.
Faço pinhão e carrinho pra menino brincar
Boneca e renda de bilro nunca gostei de fazer
Vendo boa cachaça mas não sei fabricar
Raspo coco e faço cocada pra vender e comer.
Espicho couro de boi e escalo carne de bode
Torro café com rapadura e cozinho arroz tropeiro
De chifre faço pente e corrimboque
Crio galinha, mas só como do viveiro.
Ajudo na missa e canto ladainha
Vou buscar parteira e padre para recomendar
Sei fazer cadeira pra vovozinha
E boto boneco pras crianças animar.
Descarrego carroça e caminhão
Raspo barba, cabelo e bigode de marmanjo
Corto estaca, mourão e amolo faca e facão
Se não tenho a peça certa faço um bom arranjo.
Talho canga de boi e pra porco não furar cerca
Raspo porco, torro torresmo e apuro a banha
Subo em coqueiro e descasco coco seco
E se tudo faço, de mim ninguém ganha.