A menina e a flauta

A menina à beira do rio,

beira do rio onde estava,

sozinha ao som das folhas

vestida como de nada,

pobres trapos, pobres vestes,

velha flauta afinava.

O vento frio, noite densa,

fazia tremer a carne,

vento a gelar em volta

e os olhos cheios de lágrimas.

Na moita verde, tão verde

os lobos a espiavam

sentindo o cheiro pueril

co'as bocas insaciáveis.

Com as mão trêmulas ergue

a flauta para os lábios.

erguendo à noite vazia

um canto rouco, cansado.

Quase não se ouvia a lira

do cantar pobre e fraco,

só os lobos escondidos

que a presa espreitavam

detiveram-se um pouco

ao som que os assustava.

Mas veio um vento moreno

que de norte a sul andava

parou-se na pequenina

para poder escutá-la.

A menina então sentiu

na presença de um estranho

alguém que ao som da música

fazia as folhas dançarem.

E tocando a flauta rouca

já não temia a mais nada,

nem ao escuro da noite

nem aos lobos que a cercavam.

E então tocou, tocou, tocou

até cair de cansada...

e as feras foram embora

guardando silêncio grave.

Quem te ninará pequena

no silêncio das montanhas?