Sozinho e Feliz
Os lábios do vento osculando ternamente os galhos dos ciprestes,
O cheiro ígneo e branco de mato repousando nas sombras das árvores,
O silêncio divino de nenhuma divindade e de nenhuma voz humana
Cavalga com frescor por toda a floresta a qual nasce de minhas Entranhas tão transbordantes dos uivos dos luares e da vida.
E me orvalho dentro dos perfumes das flores que meus olhos colhem,
Estou completamente sozinho e feliz,
Estou dentro dos riachos idílicos da solidão
E o fluir de meu ser é tão leve e torrencial
Como o amanhecer das manhãs chuvosas e esquecidas pelos olhos.
Cheiro uma orquídea e minha alma encontra a essência do universo!
Caminho lentamente entre os becos do silêncio e do vento
E me desencontro de todas as culturas e construções humanas:
Tudo está e vive aqui tão quieto, tão calmo,
E meus olhos chovem balsâmicas lágrimas de alegria
As quais semeiam minha solidão ao colo das folhas verdes
De minha existência irreal nos cumes montanhosos da realidade,
E tristemente passeio dentro dos bosques como a chuva que batiza
As pedras, os animais, as aves, e todo o castelo tangível da noite.
As árvores não me enxergam e sou feliz,
O chão da terra não escuta os meus pés e o êxtase da vida me inunda de sóis, de brisas, de nuvens, de primaveras cheias de rouxinóis;
O brilho do luar e das estrelas não cheiram o odor de minha inexistência,
O pôr-do-sol não afaga as feridas catequizadas e metropolizadas
Que antes velavam o meu corpo anoitecido de conhecimentos dúbios, hostis, embrutecidos e inscientes;
HOJE estou completamente esquecido e feliz.
Volto para minha casa tão absurda quanto os cânticos de meu coração,
E sinto as mãos pálidas de uma prece incrédula dentro de minhas veias.
Acendo a lareira e pego o livro sobre o criado-mudo:
Leio a mim mesmo sem querer me entender,
Escuto-me a mim próprio como um rio que não se ouve
E que flui o seu devir sem normas e sem precisar pensar.
Acendo-me com querosene e me anoiteço sem filosofias e sem palavras,
Fecho-me a porta da frente e dos fundos a fim de que as névoas do silêncio inundem cada sala e quartos de minha humilde casa que mora em mim;
Apago as velas em cima da mesa, e toda a quietude e o vazio da vida
Volvem meu corpo feliz e já adormecido até o meu leito_
Durmo sem nunca ter nascido para as modernas e arcaicas civilizações,
Durmo em mim, e as mãos da Vida me contam fábulas apocalípticas.
Me Amanheço solitariamente com os cantos dos pássaros
Que repousam nas extremidades das janelas úmidas de minha alma,
Abro a porta e saio, ainda sonolento, de casa:
Caminho em direção aos dorsos de todos os rugidos do horizonte_
Novas estradas orbitam ao redor das seivas de meu coração marítimo.
Abro os olhos e só há a verdade emudecida das pedras e das árvores,
E minha felicidade é um extenso rio de borboletas a bailar no âmago das rochas que batem com ímpeto nas ondas de minhas jubilosas lágrimas.
Estou inteiramente SÓ e FELIZ.
Gilliard Alves Rodrigues