Beija-flor e bem-te-vi
I
Perdido por uma estrada
Um sabiá sem mangueira
Procurava uma porteira
Para poder repousar.
Um sibito do lugar
Disse-lhe: "Não pouse aqui,
Pois o carcará que eu vi
Vai lhe caçar sem pudor.
Avisei ao beija-flor
E também ao bem-te-vi.
II
O sabiá bem ligeiro
Buscou um galho escondido,
Levemente retorcido
Pelo vento passageiro.
Mas um gaturamo arteiro
Daqueles cheios de si,
Teimou em ficar ali
E não lhe sobrou nem cor.
Isso assusta o beija-flor
E também o bem-te-vi.
III
Crepúsculo de alaridos
Nesta terra verde e chã,
Logo revela a manhã
Com seus raios coloridos.
Nos pés de frutas floridos:
Tem laranja, sapoti,
Acerola, murici,
Misturando luz e cor,
Convidando o beija-flor,
Atraindo o bem-te-vi.
IV
Primavera, belo manto,
Mesmo em noite de luar,
Vem as cores espalhar
No chão duro com encanto.
Escuto o doce acalanto
Da lambu, da juriti,
Do canário que sorri
Arrulhando com amor,
Querendo ser beija-flor
Que pensou ser bem-te-vi.
***
(Ritemar Pereira, 30/7/2019)