Intervalo
O tempo eu não reconheço
Corta-me desde o começo
Como uma grande faca afiada
Que ao mais leve toque se apraz
Numa sagacidade tenaz
De ter assim uma garganta cortada.
Não entendo do tempo o poder
Que nos faz rápido envelhecer
Deixando-me assim brutamente
Dissolvido, em suma, ferido
Sem saber claramente o sentido
De um dia ter sido semente.
Plantou-se numa conversa oblíqua
Dessa dúvida ambígua
Um beijo suave, doce, transparente
Formando-se em sublime calma
No limiar de noss’alma
Que deixa o lúcido louco e o louco deixa contente.