PINDORAMA - Descobrimento ou Invasão

RENATO ALVES

Seis mil e quinhentas luas são passadas

desde que eles chegaram a Pindorama

pelo tenebroso mar paridos.

E "descobriram" a terra já descoberta

onde Tupã pusera o paraíso:

Grandes rios, praias, florestas, igarapés...

Muitos éramos. Quantos, não sei...

Nunca soubemos contar.

(isto falta não fazia:

mais de três dizemos "tuba"

Muito araçá? – Araçatuba!

Muita canoa? – Ubatuba!)

Do seio-açu do oceano

Desgraça soprou seu vento

salgando a brisa de abril.

Chegaram em caravelas enfunadas.

Visita dos deuses? Tupã!...

Saudamos em nossa inocência...

São belos, vermelhos, fortes

eles disseram de nós:

"A feiçam deles é serem pardos

maneira d'auermelhados,

de boõs rrostros

e boõs narizes bem feitos."

Mas, em breve, vimos o real intento

surgir por trás da máscara do invasor,

desenhando aos poucos o destino

da brasílica gente desprotegida.

Impuseram a cruz a ferro e fogo,

trouxeram doença e dor.

Tomaram nossas mulheres

Para fazer um país de mamelucos

Desdenharam nossos deuses e nossa fé

Vilipendiaram nossos antepassados,

Ocuparam nossas aldeias,

Escravizaram nossa vontade.

Cantaram, fingidos, o sofrimento

de nossos heróis e heroínas

em histórias de amor mal arranjadas:

Moema, nas salgadas águas da Bahia

Lindóia, Sepé, Cacambo,

Sete Povos das Missões...

Os românticos cantaram

iracemas, ubirajaras, guaranis,

timbiras, tapuias, tupis...

Cantaram os modernistas macunaímas,

txukarramães, xingus,

mas chegamos à beira da extinção...

Vitimas dos predadores,

bandeirantes escravagistas,

portugueses, castelhanos

e suas políticas coloniais,

internamo-nos nas matas,

perdemos a identidade.

Agora, reservam-nos pequenas áreas

de nossa própria terra,

mas nos expulsam de lá

se ela é boa de plantar

ou quando há indícios de riqueza

que se possa explorar

à custa da natureza.

Isto posto, irmão branco,

ao saudar o "descobrimento"

lembre-se de Pindorama, a nação

que há seis mil e quinhentas luas

das grandes naus do mar-açu

viu chegarem os estrangeiros...

...e foi a sua perdição!

(Abril de 2000, nos festejos dos 500 anos do "Descobrimento",

na visão dos primitivos habitantes)

=======================================