14 DE MARÇO - POESIA, HOJE É SEU DIA
POESIA É...
"A poesia é um dom da alma...
É um veio de luz que eterniza pensamentos
e aproxima vários corações."
(Meg Klopper)


 
No dia Nacional da Poesia quero deixar minha mais singela homenagem aos “Poetas, Escritores, pensadores, compositores, cantadores, repentistas, happers, enfim, aos brasileiros que  escrevem, rimam, cantam, pensam e fazem poesia.
Cada um com o seu jeito deixa seu recado à posteridade com textos, versos livres e/ou providos de rima, cujo conteúdo apresenta uma visão emocional e conceitual na abordagem de idéias, estados de alma, sentimentos, impressões subjetivas etc., quase sempre expressos por associações imagéticas. E dessa forma traduzimos a poesia... 
Agradeço a todos aqueles que com sua coragem e força de vontade fizeram e fazem do mundo um celeiro artístico com abundância de provisões.
Homens e mulheres em busca da liberdade de expressão e
do reconhecimento dos seus dons e manifestação de sua arte, registram a vida com escritos maravilhosos capazes de mudar opiniões e documentar a história.
Cada verso, cada linha escrita, é sinônimo de beleza.
Através de uma luta lídima, denunciam os erros da nação, primam pelo bem comum e alertam as autoridades, em geral, para o enobrecimento da cultura.
Trocam a pena, a caneta, o lápis e o computador pelas armas.
As armas tatuam a vida com sangue, mas o poeta dá o seu sangue para que a vida seja livre, tenha sabor, cor, verdade, compreensão... O poeta não fala da violência... O poeta descreve a violência e denuncia seu horror.  A violência terrifica a vida e produz o mêdo que inibe a criação e faz debandar a beleza e a ternura.
Por isso,  hoje, 14 de Março, Dia Nacional da Poesia, minha sincera homenagem vai para todos que amam a arte de traduzir a vida através das letras e lutam pelo esplendor da expressão representando a linguagem falada através de sua alma que, em profundidade, transborda o amor . 

Vamos a alguns dos responsáveis pelo dia Nacional da Poesia:


ALVARES DE AZEVEDO
PORQUE MENTIAS?

Por que mentias leviana e bela?
Se minha face pálida sentias
Queimada pela febre, e se minha vida
Tu vias desmaiar, por que mentias?

Acordei da ilusão, a sós morrendo
Sinto na mocidade as agonias.
Por tua causa desespero e morro...
Leviana sem dó, por que mentias?

Sabe Deus se te amei! sabem as noites
Essa dor que alentei, que tu nutrias!
Sabe esse pobre coração que treme
Que a esperança perdeu por que mentias!

Vê minha palidez - a febre lenta
Esse fogo das pálpebras sombrias...
Pousa a mão no meu peito! Eu morro! Eu morro!
Leviana sem dó, por que mentias?



CARLOS DRUMOND DE ANDRADE
"NO MEIO DO CAMINHO":
No meio do caminho tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
Tinha uma pedra
No meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
Na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
Tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
No meio do caminho tinha uma pedra.

CASIMIRO DE ABREU
"MINH’ALMA É TRISTE"

(I)
Minh'alma é triste como a rola aflita
Que o bosque acorda desde o albor da aurora,
E em doce arrulo que o soluço imita
O morto esposo gemedora chora.
E, como a rola que perdeu o esposo,
Minh'alma chora as ilusões perdidas,
E no seu livro de fanado gozo
Relê as folhas que já foram lidas.
E como notas de chorosa endecha
Seu pobre canto com a dor desmaia,
E seus gemidos são iguais à queixa
Que a vaga solta quando beija a praia.
Como a criança que banhada em prantos
Procura o brinco que levou-lhe o rio,
Minh'alma quer ressuscitar nos cantos
Um só dos lírios que murchou o estio.
Dizem que há gozos nas mundanas galas,
Mas eu não sei em que o prazer consiste.
- Ou só no campo, ou no rumor das salas,
Não sei porque - mas a minh'alma é triste!



CASTRO ALVES
O NAVIO NEGREIRO

(Tragédia no mar)

IV

Era um sonho dantesco... o tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho.
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros... estalar de açoite...
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar...
Negras mulheres, suspendendo às tetas
Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
Outras moças, mas nuas e espantadas,
No turbilhão de espectros arrastadas,
Em ânsia e mágoa vãs!
E ri-se a orquestra irônica, estridente...
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais ...
Se o velho arqueja, se no chão resvala,
Ouvem-se gritos... o chicote estala.
E voam mais e mais...
Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali!
Um de raiva delira, outro enlouquece,
Outro, que martírios embrutece,
Cantando, geme e ri!
No entanto o capitão manda a manobra,
E após fitando o céu que se desdobra,
Tão puro sobre o mar,
Diz do fumo entre os densos nevoeiros:
"Vibrai rijo o chicote, marinheiros!
Fazei-os mais dançar!..."
E ri-se a orquestra irônica, estridente. . .
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais...
Qual um sonho dantesco as sombras voam!...
Gritos, ais, maldições, preces ressoam!
E ri-se Satanás!...


CARTOLA, ANGENOR DE OLIVEIRA
AS ROSAS NÃO FALAM


Bate outra vez
Com esperanças o meu coração
Pois já vai terminando o verão enfim

Volto ao jardim
Com a certeza que devo chorar
Pois bem sei que não queres voltar para mim

Queixo-me às rosas, mas que bobagem
As rosas não falam
Simplesmente as rosas exalam
O perfume que roubam de ti, ai...

Devias vir
Para ver os meus olhos tristonhos
E, quem sabe, sonhar os meus sonhos
por fim



CAETANO VELOSO
MIMAR VOCÊ


Te quero só pra mim
Você mora em meu coração
Não me deixe só aqui
esperando mais um verão
Te espero meu bem
Pra gente se amar de novo
Mimar você
Nas quatro estações
Relembrar
O tempo que passamos juntos
Bem bom viver
Andar de mãos dadas
Na beira da praia
Por esse momento
Eu sempre esperei


CHICO BUARQUE
CAROLINA


Carolina, nos seus olhos fundos guarda tanta dor, a dor de todo esse mundo
Eu já lhe expliquei, que não vai dar, seu pranto não vai nada ajudar
Eu já convidei para dançar, é hora, já sei, de aproveitar
Lá fora, amor, uma rosa nasceu, todo mundo sambou, uma estrela caiu
Eu bem que mostrei sorrindo, pela janela, ah que lindo
Mas Carolina não viu...
Carolina, nos seus olhos tristes, guarda tanto amor, o amor que já não existe,
Eu bem que avisei, vai acabar, de tudo lhe dei para aceitar
Mil versos cantei pra lhe agradar, agora não sei como explicar
Lá fora, amor, uma rosa morreu, uma festa acabou, nosso barco partiu
Eu bem que mostrei a ela, o tempo passou na janela e só Carolina não viu.


DORIVAL CAYMMI
O QUE É QUE A BAIANA TEM?


O que é que a baiana tem?
Que é que a baiana tem?
Tem torço de seda, tem! Tem brincos de ouro, tem!
Corrente de ouro, tem! Tem pano-da-Costa, tem!
Tem bata rendada, tem! Pulseira de ouro, tem!
Tem saia engomada, tem! Sandália enfeitada, tem!
Tem graça como ninguém
Como ela requebra bem!...


JORGE AMADO
O GATO MALHADO E A ANDORINHA SINHÁ
«O mundo só vai prestar
Para nele se viver
No dia em que a gente ver
Um gato maltês casar
Com uma alegre andorinha
Saindo os dois a voar
O noivo e sua noivinha
Dom Gato e Dona Andorinha»



MACHADO DE ASSIS
A UMA SENHORA QUE ME PEDIU VERSOS


Pensa em ti mesma, acharás
Melhor poesia,
Viveza, graça, alegria,
Doçura e paz.

Se já dei flores um dia,
Quando rapaz,
As que ora dou têm assaz
Melancolia.

Uma só das horas tuas
Valem um mês
Das almas já ressequidas.

Os sóis e as luas
Creio bem que Deus os fez
Para outras vidas.



MÁRIO QUINTANA
"SE EU FOSSE UM PADRE":

Não citaria santos e profetas:
nada das suas celestiais promessas
ou das suas terríveis maldições...
Se eu fosse um padre eu citaria os poetas.



TOM JOBIM
GAROTA DE IPANEMA


Olha que coisa mais linda
Mais cheia de graça
É ela menina
Que vem e que passa
No doce balanço, a caminho do mar
Moça do corpo dourado
Do sol de Ipanema
O seu balançado é mais que um poema
É a coisa mais linda que eu já vi passar …
Ah, porque estou tão sozinho
Ah, porque tudo é tão triste
Ah, a beleza que existe
A beleza que não é só minha
Que também passa sozinha
Ah, se ela soubesse
Que quando ela passa
O mundo inteirinho se enche de graça
E fica mais lindo
Por causa do amor



VINICIUS DE MORAES
SONETO DE FIDELIDADE


De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure


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ADÉLIA PRADO
COM LICENÇA POÉTICA


Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.


ANA CRISTINA CESAR
FLORES DO MAIS


devagar escreva
uma primeira letra
escreva
nas imediações construídas
pelos furacões;
devagar meça
a primeira pássara
bisonha que
riscar
o pano de boca
aberto
sobre os vendavais;
devagar imponha
o pulso
que melhor
souber sangrar
sobre a faca
das marés;
devagar imprima
o primeiro
olhar
sobre o galope molhado
dos animais; devagar
peça mais
e mais e
mais


CECÍLIA MEIRELES
4º MOTIVO DA ROSA


Não te aflijas com a pétala que voa:
também é ser, deixar de ser assim.
Rosas verá, só de cinzas franzida,
mortas, intactas pelo teu jardim.
Eu deixo aroma até nos meus espinhos
ao longe, o vento vai falando de mim.
E por perder-me é que vão me lembrando,
por desfolhar-me é que não tenho fim



CLARICE LISPECTOR
A Paixão Segundo G.H.


"Eu escrevo sem esperança de que o que eu escrevo altere qualquer coisa. Não altera em nada... Porque no fundo a gente não está querendo alterar as coisas. A gente está querendo desabrochar de um modo ou de outro..."



CORA CORALINA
ASSIM EU VEJO A VIDA


A vida tem duas faces:
Positiva e negativa
O passado foi duro
mas deixou o seu legado
Saber viver é a grande sabedoria
Que eu possa dignificar
Minha condição de mulher,
Aceitar suas limitações
E me fazer pedra de segurança
dos valores que vão desmoronando.
Nasci em tempos rudes
Aceitei contradições
lutas e pedras
como lições de vida
e delas me sirvo
Aprendi a viver.


ELISA LUCINDA
QUANTO MAIS VELA MAIS ACESA


Um dia quando eu não menstruar mais
vou ter saudade desse bicho sangrador mensal
que inda sou
que mata os homens de mistério

Vou ter saudade desse lindo aparente impropério
desse império de gerações absorvidas

Desse desperdício de vidas
que me escorre agora mês de maio.

Ensaio:

Nesse dia vou querer a vida
com pressa
menos intervalo entre uma frase e outra
menos respiração entre um fato e outro
menos intervalos entre um impulso e outro
menos lacunas entre a ação e sua causa
e se Deus não entender, rezarei:

Menos pausa, meu Deus
menos pausa.


HILDA HILST
POEMAS AOS HOMENS DO NOSSO TEMPO


Amada vida, minha morte demora.
Dizer que coisa ao homem,
Propor que viagem? Reis, ministros
E todos vós, políticos,
Que palavra além de ouro e treva
Fica em vossos ouvidos?
Além de vossa RAPACIDADE
O que sabeis
Da alma dos homens?
Ouro, conquista, lucro, logro
E os nossos ossos
E o sangue das gentes
E a vida dos homens
Entre os vossos dentes.


LYGIA FAGUNDES TELLES
VERDE LAGARTO AMARELO


(...)
"Com a ponta da língua pude sentir a semente apontando
sob a polpa. Varei-a. O sumo ácido inundou-me a boca. Cuspi a semente: assim queria escrever, indo ao âmago do âmago até atingir a semente resguardada lá no fundo como um feto".


NÉLIDA PIÑON
I LOVE MY HUSBAND (CONTOS)


(...)

Sou grata pelo esforço que faz em amar-me.
Empenho-me em agradá-lo, ainda que sem vontade às vezes, ou me perturbe algum rosto estranho, que não é o dele, de um desconhecido sim, cuja imagem nunca mais quero rever.
Sinto então a boca seca, seca por um cotidiano que confirma o gosto do pão comido às vésperas, e que me alimentará amanhã também.
Um pão que ele e eu comemos há tantos anos sem reclamar, ungidos pelo amor, atados pela cerimônia de um casamento que nos declarou marido e mulher
Ah, sim, eu amo meu marido.


MEG KLOPPER,
14 DE MARÇO - DIA NACIONAL DA POESIA


Façamos versos rimados, doídos, despidos, com arrepios
Com ou sem calafrios, chios, cobertos pela beleza e magia
Num dia de glória que deixa sempre marcas na história
Em que as letras se juntam para o Dia Nacional da Poesia.

Agradeço ao Universo o que nos  foi confiado
Nós, que escrevemos e contamos a vida...
Trazemos conosco a certeza de um grande legado
Criamos textos e versos que testificam nossa lida.

Pensamentos voltados ao imaginário, ao belo
Exercícios , cuja arte quase nos iguala a um atleta
Escrevemos o que nossa consciência decreta
E como a querida Cecília Meireles, afirmo:

“Não sou alegre, nem sou triste: sou poeta”.