Os Brasilíadas
Thales de Athayde
No sopé do monte ao fim da praia
Onde o mar do céu a cor tomou
E no verde-folha como um manto aberto
Á colina acima o luzitano olhar pousou!
Na areia alva e virgem banhada ao sol
Pisaram e entraram neste chão
E profanaram e macularam o santuário
E conquistaram, deslumbrados, este torrão!
Homens e mulheres nus, na cor do bronze
Surgiram dentre as sombras florestais
Sem notarem o mal que lhes mirava.
Veio a turba e achegavam mais!
Olhos e gestos indecentes
Em confronto aos puros eminentes,
Os corpos tão próximos a se medirem...
E debalde viveram inocentes!
Tombaram ao solo derribados
Na virgem floresta o mogno, o ipê,
O pau-brasil, a aroeira, o jequitibá,
E se plantaram vilas e choças de sapé.
Á terra abundante o leite, o mel, surgia
Qual Canaã acolhedoira e generosa.
O ouro, as pedras, o minério saltavam
Do cascalho em força poderosa!
E os olhos do mundo cobiçavam
A riqueza do nosso Eldorado:
Esmeralda, rubi, ouro, diamante,
Em colossal volume encontrado!
As herdades, as posses, doava
A Corte aos faustos lusitanos,
Que donos da Terra de Santa Cruz
Tornaram-se colonizadores ufanos!
A pujança do Novo Mundo atraía
As naus do Velho Mundo, e navegavam,
E chegavam, e aportavam
E iam, e vinham. E levavam...
Mas em Vila Rica despontava o Alferes
Que por a terra amada a Corte enfrentou,
E foi traído pelo covarde inconfidente.
Mas o ideal de liberdade se plantou.
Quando nem mesmo a morte soterrou esse ideal
De heroísmo, o sacrifício com sangue marcou
O estandarte da tirania em nosso berço! Tiradentes!
O herói surgiu! Nasceu! Brotou!
E veio cá a Corte a se assentar – a fugir?
De lá? De Napoleão? Da guerra?
E aportou o luso cetro: o Império
A dominar os homens desta terra!
Negros escravos, acorrentados, sem esperança,
Brancos cativos da tirania, do saque à exaustão!
Mas do horizonte no mar qual porta aberta
Despontava o sol da liberdade em nosso chão!
E no Ipiranga às margens plácidas,
Espada erguida, braços abertos,
Corcel fogoso, bravo, valente,
Da tirania enfim libertos!
Independência! - gritava alto.
Independência da lusa Corte!
Independência! - gritavam todos!
Independência ou mesmo a morte!
E de um povo escravo, amordaçado,
Surgiu um povo livre, uma Nação
Entre as demais, imensa, majestosa,
De brasileiros ufanos: irmãos!
E findo o trono tirano e vergonhoso
Surge o Pavilhão de um povo ordeiro
Que, tremulando sobre o futuro,
Deu digno nome ao brasileiro!
E no fragor republicano um novo ideal
Onde o perpétuo cetro por fim caiu
E frágil, e destronado, ao Velho Continente voltou,
Deixando livres negros, brancos e o Brasil
E os rebentos vigorosos que nascendo
Herdaram o heroísmo, a valentia,
E sustentaram o auriverde pendão no alto
Que mais cresceu e alçou. E pasmo o mundo assistia!
E no central planalto enfim erguido
O Paço imponente da Brasília majestosa,
Como marco de um povo próspero e pacífico,
Como cetro de uma nação rica e esperançosa!
E a América a mirar e admirar e invejar
O gigante desperto, o gigante florão,
Em berço esplêndido, ao som do mar
E à luz profunda! A emergente Nação!