MEU ESPERADO RETORNO

Querida, voltei.

Vamos abrir as janelas, ligar as luzes, tirar o pó que nem nos deixava respirar de tão áspero, vamos ver se tem alguma conta na caixa de correio.

Já podemos respirar de novo, desarmar cada nó dos nossos pelos, arrancar fora esses imensos tumores que não nos permitem reconhecer o outro nem por toque, nem pelo cheiro, nem pelo endereço,

Querida, voltei!

Vamos chutar pra longe essas infinitas pedrinhas que tivemos tanta paciência para colocar entre os dedos do nosso pé,

vamos dar um chega pra lá nessas tantas ervas-daninhas que, com candura de monge, regamos tão fielmente todas nossas manhãs, todas nossas manhãs.

Querida, voltei...

Vamos voltar a nos conhecer e reconhecer como gente, vamos voltar a fazer parte do mesmo time, chega de só buscar munição pra guerra, chega de só colocar a perna pra que o outro tropece assim que sai da cama.

Querida, voltei.

Chega de rebarbas, chega de só fiapos na alma, chega dessa cama sempre arrumada, chega das nossas teclas sumirem justo na hora da nossa sonata preferida,

chega desse elevador só passar direto pelo nosso andar.

Querida, voltei?

Agora dá gosto buscar o nosso pão, agora faz sentido não ficarmos à deriva até o final dos tempos, com o nosso surrado barco só fazendo água, só fazendo água.

Agora faz sentido não ter e tendo uma aliança abraçando o dedo,

agora faz gosto acordar de manhã e mergulhar dentro de você com a minha paixão enrigecida, com minha língua se dizendo presente pra lambuzar tudo o que estiver à milhas de distância,

agora já podemos pendurar na parede aquela foto da gente no final da vida, você fazendo tricô e eu retaguardando a sua alma e escorando cada batida do seu coração, com os nossos frutos longe, mas cada vez mais perto da gente, cada vez mais perto da gente.

Acredite, a nossa tempestade em alto-mar foi o maior presente que Deus poderia ter reservado para nós.

Estamos saindo dessa guerra com a larica das aves de rapina, a força que parecia que tínhamos cuspido num fosso sem fundo, agora nos jorra para quaisquer Everests que enfiarem nos nossos úteros, que misturarem nas nossas bebidas, que costurarem nas nossas roupas feito emblema de escola, feito tatuagem que a gente fez em nós mesmos com o dedo do outro, com o dedo do outro.

Querida, voltamos!

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Oscar Silbiger
Enviado por Oscar Silbiger em 17/04/2009
Reeditado em 14/01/2024
Código do texto: T1543749
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