O JARDIM

Ontem escrevi poemas

Nos canteiros do meu jardim.

Animada, afogueada, em alvoroço,

Abraçada a vasos, folhas e pétalas,

Inspirada ao aspirar o aroma silvestre

Das flores, das plantas, da seiva,

Declinei o lápis sedutor e o papel,

Tomei a terra, o ancinho e a colher,

Decidida, quebrei ressequidas ramagens,

Exaltada, daninhas ervas arranquei,

Ao solo me lancei, confiante, e mergulhei

Minhas mãos, na terra fértil e gentil.

Tirei pedras e raízes, desenhei linhas

De promissores bolbos, enterrados

Sob o húmus revolvido e alisado.

Sementes lancei, em métrica cuidada.

Azáleas rimei com admiráveis ciclamens.

Margaridas de fogosas vestes combinei

Com amarelos narcisos em sono recatado.

Confortei o cândido limoeiro e ergui, por fim,

Para o céu, o corpo cansado e feliz,

As faces coradas, o cabelo em desalinho,

Acompanhando a aragem e o sol alaranjado –

Chave de ouro de outonal entardecer –

No caminho luminoso do Poente.

Ilona Bastos
Enviado por Ilona Bastos em 07/11/2006
Código do texto: T285087