A Madame Du Chatelêt sobre a AMIZADE

Se quereis que ainda ame agora,

Tornai-me à idade do amor.

Dos meus dias ao sol-pôr

Que brilhe uma nova aurora.

O Tempo tem-me cativo,

E manda que eu não mais vá

Onde quer que o ébrio Divo

Com Amor reinando está.

De tão dura austeridade

Tiremos algum valor:

Quem não vive a sua idade

Dela sofre só a dor.

À juventude deixemos

Suas paixões sem juízo:

Só dois momentos vivemos:

Seja um deles o do sizo.

Para sempre me deixais,

Ternura, ilusões, loucuras!

Dons do céu, que consolais

Do vivente as amarguras!

Duas vezes nós morremos:

Não amar nem ser amável —

Oh, que morte insuportável:

Deixar a vida é o menos.

Assim a perda eu chorava

Dos erros da juventude;

E minha alma lamentava

Suas fugas à virtude.

A Amizade veio então

Em meu socorro, superna.

Como o Amor será tão terna,

Mas mais viva que ele... não.

Tocado de luz tão bela,

E de tamanha beleza,

Seguia-a, mas na tristeza

De não seguir mais do que ela.

Voltaire
Enviado por Poeta Dom Casmurro em 19/12/2012
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