Humildade e empatia
(E agora, José? II)
Estava na calçada
fazendo a limpeza diária
quando um vizinho e sua filha
que por ali estavam a passar
resolveu dar um tempo
e comigo conversar:
"Parabéns!..." - disse ele
e antes que dissesse o resto
fiquei a me perguntar...
do que este homem está falando?
o aniversário é semana que vem,
seria disso que ele está a falar?
Mas, não era...
"...se todos fizessem como você,
a cidade seria uma beleza!"
Entendi, então, a que ele se referia.
Era sobre a missão diária...
embora alguns achem meio doido,
mantendo a rua limpa e até o quarteirão,
a marginal do Paraitinga e sua calçada padrão.
Às vezes durante o dia,
à noite, de madrugada,
sempre que estiver àtoa
e com a devida disposição.
"Faço apenas a minha parte..."
Foi o que lhe respondi.
"Não, você faz mais que isso!
Eu mesmo só fico olhando,
observando todos os dias.
Só não lhe ajudo por vergonha.
E às vezes, quando penso nisso,
fico com vergonha de mim...
devia ser como você!
Não se envergonhar do que faz..."
Só consegui responder:
"Cada coisa a seu tempo.
A primeira tarefa de Ghandi
aos que vinham de longe
com intenção de segui-lo
era limpar as latrinas
para aprender a humildade.
A maioria desistia logo
e voltava à sua cidade..."
Na verdade para mim
isso é pura distração;
jeito meu de me concentrar,
fazer a minha meditação,
refletir sobre os valores da vida
e simultaneamente produzir...
Três dias depois ele,
o José da mesma rua,
foi para outra dimensão...
E nós, próximos-afastados,
estávamos sempre ocupados
com nossa própria distração.
Não por opção nossa,
mas por simples comodismo,
só vendo o tempo no passado;
O que nos aproximou
foi o meu comportamento
e o seu olhar diferenciado.
Ele foi pra longe, muito longe,
mas não sem antes deixar
para sempre o seu recado:
"Diga hoje o que pensa
a quem está ao seu lado,
amanhã poderá ser tarde,
o momento terá passado!"
Gostei da sua atitude,
aprendi algo com ele
e tentarei praticar...
Os de longe não tem jeito
mas os próximos...
preciso ao menos visitar.
Ou, de vez quando,
deixar de lado minha pressa,
parar na rua e conversar...