Caixa de guardados

Um poema e algumas fotografias

Duas troças são relíquias

Um punhado de bilhetinho

Um monte de saudade

Um resto de carinho

Um palito de sorvete,

Papéis de bala e um rabisco de giz

Neste dia, eu fui feliz

Um recado de batom

Na capa do caderno,

Uma promessa, que ainda vinga

De que meus filhos serão teus

Não os tive, mal conheço os seus

Fadiga de lembrar, a ansiedade matinal

Quando as manhãs faziam sentido

Quando o meio-dia era mais colorido

Quando meu lábio

Afogava no seu

Quando Murilo legislava leis

Fora dos muros do colégio

E os olhos do padre

Na confusão de nossas línguas

Previa sacrilégio

E eu, tão moço

E morrendo sem saber

Abdicando tudo

Pra seguir em frente

Com pressa, com pressa

Um boneco de nome Tico

Recheado de miçanga, com cara de borracha

Está perdido nos meus guardados

Materializando a lembrança

Do sonho que tive

Quando as quintas me foram prometidas

Em troca de beijos e mordidas

Dessa boca cativa

Enquanto durasse o prazer

Quando meus dedos

Furtaram descuidados

A pureza de sua juventude.

Nestes dias, o olfato me trai

A certeza se esvai

Já nem sei se vivi

A música sucumbe

A fita azul desbota do vestido

Igual a tinta que previa

Lançada no branco opaco do verso da fotografia

Em linda caligrafia

O fim que chegou.

Túlio Reis
Enviado por Túlio Reis em 19/01/2006
Código do texto: T101066
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