De olhos fechados
De olhos fechados
Somente o beijo cego
Sente a boca como é
Amei ao limiar da loucura
Catando dejetos
como tesouro
O engano é a matéria-prima
da juventude
Mas nos persegue
a vida inteira
De olhos fechados,
me entreguei
Cego à luz,
fui só instinto
Tomado por sentimento
A lógica
não fazia sentido
Tudo que sabia
Era o que sentia
Insano viver sonhando...
Mas, sem sonho, que me resta?
De humano, de vivo?
De sonhos em sonhos
Que se desfazem sucessivamente
Com sempre novos
Eternos amores
Com sempre novos
Brilhantes caminhos
Nos renovando,
Envelhecemos
Então, não queremos
Mais despertar
Serei feliz um dia?
Já fui!
Fui feliz alguns dias
Algumas vezes
Alguns momentos
Serei novamente
Hei de amar novamente
E novamente me enganarei
Não há como ser feliz
Sem sonho e engano
Ser feliz é isolar a alegria
Cortando os fios da memória
Que nos prendem ao passado
Enchendo o futuro com êxtase
Esticando o instante indefinidamente
Vivi e morri de amores...
São tantas as almas que habitam
Dentro de mim!
E, imortalizados,
Inúmeros esquecimentos
No momento
Nem sei bem quem sou
Só assim logro
seguir vivendo
Quando choro,
fecho meus olhos
E sinto tua boca
novamente
Um outro momento feliz!
Esqueço a perdi
Mas lembro de tê-la
Ah, lembro! E relembro...
Só assim
De olhos fechados
Encontro quem sou
Quem fui e serei
E todos se fundem
num só
Só assim
De olhos fechados
Fujo das sombras
Que toda luz gera
Só assim
Vivendo a quimera
De teres me amado
Só assim
De olhos fechados
Me escondo de mim
Enfim
Está tudo acabado
E renasce... de novo
Se não fui
Não fui por um triz
Tantos fui que
Perdi a matriz
De quem sou
Do que fiz
Só não fui
Quem eu quis
Enquanto eu choro
Outro me diz
Quem já foi um dia
Há de ser sempre
Feliz
(Djalma Silveira)