Uma Estação, Verão

Eu já a conheci assim

Bela, vivida, inexperiente

E dona de um suor cujo perfume

Fazia os machos se voltarem para ela

Tive que ensiná-la tudo o que não aprendi

Nas aulas que não freqüentei,

Porque a vida ainda não tinha me dado tempo

Deixei o futebol na Praia de Icaraí

E fui direto para um batalhão de fuzileiros

Até que Tancredo Neves, em campanha,

Fez-me pôr os pés na Avenida Rio Branco...

Era lá o Comitê Aureliano Chaves

Onde, em uma tarde de chuva de verão,

Em meio aos sons dos trovôes, conheci Flávia

Logo, logo, foi por água minha timidez

E dividíamos o mesmo quarto, todo o tempo,

No seu apartamento de Copacabana

Carícias, noites mal dormidas, banhos de suor

Mordidas que não marcavam nossas carnes,

Beijos molhados nos seus lábios escuros

E todo dia uma surpresa para mim

Certa noite, decidimos jantar fora

Ela vestiu uma minissaia branca, justa

E além das coxas grossas, das pernas esculpidas,

Eu contemplava o que não via,

As nádegas carnudas em ancas de muitas linhas

E seus vastos pêlos dourados

Que encobriam a casa de abelhas cheia de mel

Já no restaurante, acomodados,

Um de frente para o outro,

Antes mesmo que eu pudesse correr os olhos pelo cardápio

Ela me fez ver, por sob a mesa,

As pernas abertas e o sexo exposto

Foi enorme e obsceno o meu prazer,

Pois foi felicidade de dono e senhor

Não vivíamos o casamento

De até que a morte nos separe

Mas não estávamos distantes

Nem de uma nem de outra realidade

As nossas liberdades, cheias de possessão,

Poderiam sim, em uma tragédia,

Selar o destino de um, senão os nossos

Uma tarde chego em casa

E encontro minha amada, seminua,

Na sala, em um sofá, com os dois seios expostos, posava

Uma onda de calor veio do peito ao rosto

E explodi como uma bomba de nêutrons

Com ciúmes mortais do pincel, da mistura de tintas

E do pérfido artista que encerrava Flávia em uma tela

Foi um amor de tempestade, de verão

Que se abrandou no outono, nas folhas secas

Das amendoeiras que se despiam na Avenida Atlântica

Naquele 1985 não nos apercebemos do inverno e,

Quando floresceu a primavera, amarelando os Ipês do Rio de Janeiro,

Já caminhávamos, de mãos dadas como irmãos,

Pela Siqueira Campos e seus arredores

Márcio Ribeiro
Enviado por Márcio Ribeiro em 30/09/2008
Reeditado em 30/09/2008
Código do texto: T1203549