Ode à amizade verdadeira e ao Amor Fiel

Vinte e Oito

"Amar a quem nos despreza

E a sina que a gente tem.

Eu desprezo quem me odeia,

Eu adoro quem não me quer bem.

Quanto fito o teu olhar

Tão frio e tão indiferente,

Fico a chorar um amor

Que o meu coração não sente.

Há sonhos que ao enterrar-se

Levam dentro do caixão,

Pedaços de nossa alma,

Pedaços de nosso coração.

Ai as almas dos poetas

Não as entendem ninguém;

São almas de violetas

Que são poetas também.

Só quem embala no peito

Dores amargas e secretas

É quem em noites de luar

Pode entender a alma dos poetas.

O dia chora. Agonizo

Com ele meu doce amor.

Nem a sombra de um sorriso,

Na natureza diviso,

A dar-lhe vida e frescor.

O dia parece um réu.

Bate a chuva nas vidraças.

É tudo um imenso véu.

Nem a terra nem o céu

Se distinguem. Mas tu passas...

Rasgam-se todos os véus.

As flores abrem, sorrindo.

Pois se eu vejo os olhos teus

A fitarem-se nos meus,

não há nada de tudo ser lindo?

Pelo copo de cristal e pela prata

Bebo uma saudade estranha e vaga,

Uma saudade imensa e infinita

Que, triste, me deslumbra e me embriaga.

Ah, e já passaram esses tempos áureos,

E já fugiu a nossa mocidade...

Mas quando penso nesses dias lindos,

Que tortura, minha alma e que saudade!

Eu sei que não te tenho amor,

Bem o leio no teu olhar,

O amor quando é sentido

Não se pode disfarçar.

Não há amor nesse mundo

Como o que eu sinto por ti,

Que me ofertou a desgraça

No momento em que te vi.

Tanto ódio e tanto amor

Na minha alma contenho;

Mas o ódio inda é maior

Que o insano amor que te tenho.

Odeio teu sorriso doce,

Odeio teu lindo olhar,

E ainda mais a minha alma

Por tanto e tanto te amar!

Quem na vida tem amores

Não pode viver contente,

É sempre triste o olhar

Daquele que muito sente.

Com tanta contradição,

O que é que a tua alma sente?

És alegre como a aurora,

És triste como um poente.

Acreditar em alguém

é coisa que ninguém faz;

tudo quanto o amor constrói

a inconstância desfaz.

Viver sozinho no mundo

É a minha triste sorte.

Ai quem me dera trocá-la

Embora fosse pela morte.

Quando não me quiseres mais,

Mata-me por piedade!

Deixares-me a vida, sem ti

É bem maior crueldade!

Queria ser a erva humilde

Que pisasses algum dia,

Pra debaixo de teus pés

Morrer em doce agonia.

Tu não sabes, meu amor,

Que, quem espera, desespera?

O tempo está um encanto...

E Vai linda a primavera...

Que imensa mágoa me invade,

Que dor o meu peito sente.

Tenho uma enorme saudade

De ver teu rosto tão ausente!

Volto pra casa. Que tristeza.

Inda é maior minha dor...

Vem depressa. A natureza

Só fala de ti, amor!

Tu julgas que eu não sei que tu me mentes

Quando teu doce olhar pousa no meu?

Pois julgas que eu não sei o que tu sentes?

Qual a imagem que alberga o peito teu?

Mas finjo-me enganado, meu encanto,

Que um engano feliz vale bem mais

Que um desengano que nos custa tanto.

Eu era infeliz na terra,

Ninguém me compreendia,

Quando a minha alma chorava

Todos pensavam que eu ria...

E tu? Sozinho no mundo

Nunca tive o que os outros tem:

Pai, mãe, ou um marido fiel...

Morri decepcionada por não ter ninguém.

Minha amiga. Como és fraca e como és forte!

Como sabes ser doce e desgraçada.

Como sabes fingir quando em teu peito

A tua alma se estorce amargurada.

Quanta paixão e amor às vezes têm

Sem nunca o confessarem a ninguém

Doces almas de dor e sofrimento.

A saudade é tão cruel,

É uma tão profunda dor;

Que em troca eu quisera o fel

Que bebeu o nosso Senhor.

Amor, é comunhão de almas

No mesmo sagrado altar;

Contigo, amor de minha alma,

Quem me dera comungar.

Por isso, fiquei sem fé; e toda a gente

Eu digo sempre, embora magoada:

Não acredito em Deus e a virgem Santa

É uma ilusão apenas e mais nada.

Mas olha pra mim, amor, olha pra mim;

Meus olhos andam loucos por te olhar!

Cega-me com o brilho de teus olhos

Que cego ando eu há muito por te amar.

Eu grito a minha dor, a minha dor intensa.

Esta saudade enorme, esta saudade imensa.

E só a voz do eco à minha voz responde...

Eu te sigo e tu foges. É este o meu destino:

Beber o fel amargo em luminosa taça,

Chorar amargamente um beijo teu, divino,

E rir olhando o vulto altivo da desgraça.

Tu me foges, e eu sigo o teu olhar bendito;

Por mais que fujas sempre, um sonho há de te alcançar

E um sonho pode andar por todo o infinito,

De que te serve fugir se um sonho há de te encontrar?

A esta hora branda de amargura,

A esta hora triste em que o luar

Anda chorando, ó minha desventura

Onde estás tu? Onde anda o teu olhar?

Quem me dera também, amor, que fosse

Esta a hora de todas a mais doce

Em que eu unisse as minhas mãos com as tuas...

Amei-te muito, muito! Tão risonho

Aquele dia foi, aquela tarde...

E morreu como morre todo o sonho

Deixando atrás de si só a saudade.

Ah! Todo eu sou sombras, sou espaços.

Perco-me em mim na dor de ter vivido.

E não tenho a doçura duns abraços

Que me façam sorrir e ter nascido.

Ando perdido nestes sonhos verdes

De ter nascido e não saber quem sou,

Ando cego a tatear paredes

E nem ao menos sei quem me cegou!

Ter dentro da alma a luz de todo o mundo

E não ver nada neste mar sem fundo,

Poetas meus irmãos, que triste sorte!

E nos chamam a nós iluminados!

Pobres cegos sem culpas, sem pecados

A sofrer pelos outros até a morte.

Sou aquele que passa e ninguém vê...

Sou a que chamam de triste sem o ser...

Sou o que chora sem saber o porquê...

Sou talvez a visão que alguém sonhou,

Alguém que veio ao mundo pra me ver,

E que nunca na vida me encontrou!"

Gilliard Alves
Enviado por Gilliard Alves em 07/12/2008
Reeditado em 06/06/2011
Código do texto: T1323495
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