Amor Sublime

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(Poesia publicada na obra autobiográfica do autor: "Vida Após a Vida", pela Ed. Viena)

Quando primeiramente nos vimos, ela pareceu-me incoerente,

Porém, assim como quem não quer nada, tocou-me levemente,

E ao ler errado nas entrelinhas, temi e ansiei por fugir.

Demonstrando sabedoria, ela dizia não se tratar de um encontro,

Mas de algo em sonhos anunciado, um enaltecido reencontro...

Todavia, no meu ceticismo característico, ateísta a desdenhei.

Eu exercia com vigor a áspera convicção de ficar sozinho,

Mas ela, com calma e astúcia, reaproximou devagarzinho,

E sem alarde alcançou minha consentida solidão.

Na resignada aceitação submetida, a tive como uma amiga,

Que numa calculada sutileza, falava de anjos, de vida antiga...

E, terna e gentil, tocou profundamente meu inóspito coração.

Ainda um casca-grossa inveterado, de austera convicção,

Aos poucos, fui perdendo o aferro à sua doce persuasão,

De larga sapiência, assentamento e gestos angelicais.

Ela era um amalgama de ternura e algo mais que o belo,

E minou de vez a resistência do meu abarbarado castelo,

Apresentando-me ao inédito, a sonhos sonhados jamais.

Falava-me do onírico ao real, de vidas vividas, de raiz,

Com a digna humildade do mestre que também é aprendiz,

Mas com a propriedade de quem jamais teme errar.

Abrindo minha mente e meu coração, antes descrentes,

Para o invisível que vive numa outra esfera ascendente,

Que existiu, coexiste e para todo o sempre estará lá.

Como a própria Vênus, ela detém encantos da planta à palma,

Porém, é marcada por densas cicatrizes incrustadas na alma,

Numa fundura invisível ao cinzel do mais hábil escultor.

Mas, na humildade, é outra beleza que ela exala e valoriza,

A citada por Exupéry, invisível aos olhos, a câmeras e prismas:

A pulcra, transcendental e excelsa formosura interior.

Sorriso largo, sem motivo, bobo como criança elogiada,

Algo como o anseio pelo reencontro na tarde esperada;

O desejar sem possessão, que não castra a liberdade.

O ser do outro sem pedir, o sonhar sem dormir; a esperança

De suportar a vil distância, que no peito causa ânsia,

E nos incita a imaginação, fazendo sorrir sem ter vontade.

Deslizante e sutil como o próprio sono e a falaz serpente,

A saudade vai se esgueirando e penetrando a alma da gente,

Até do espírito, do coração, do corpo... do todo se apossar.

Arrebata a concentração do dia, o sono da noite; e o alarido

Leva-nos a inspirações singulares, por vezes sem sentido,

Que falam da ausência, da espera, da lembrança a fustigar.

Maravilhosa, ela devolveu-me a vida e extintas emoções,

Restaurando um antigo sentir, de indizíveis proporções,

Que permite amar sem tocar, e sentir saudade sem dor.

Fez de mim um ser melhor, com valor e responsabilidade;

Um discípulo da paz, da mansidão e da virtuosa humildade;

Desta mistura de emoção com razão, deste verdadeiro amor.

Nardélio Luz
Enviado por Nardélio Luz em 03/05/2006
Reeditado em 29/11/2007
Código do texto: T149554
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