O Silêncio no olhar

Queria muito que você estivesse aqui

Estivesse me olhando

Dando-me a mão para levantar.

Eu queria muito

Poder abraçar neste momento,

E dar-lhe um beijo,

E dizer o quanto foi importante na minha vida,

O quanto dela é tua,

O quanto dela estragaste,

No sentido mais profundo que possa existir...

Olha,

Eu não me tornei nada daquilo,

E queria que me visse,

Visse toda a minha habilidade

Falando de coisas muito diversas

Para pessoas que não imaginam

De que mundo vim...

É para mim muito difícil,

Eu olho para essas pessoas

E não me sinto a vontade,

Não podem compreender-me,

E eu fico pensando se tenho

Alguma coisa que realmente

Valha a pena ser dita...

Eu, você sabe de mim,

Não sei em que resultei...

Todas as minhas hesitações,

Essa sensação de que posso caí

A qualquer momento,

De que possa ser descoberto,

A qualquer momento,

Toda minha fragilidade...

Tudo isso,

Provém daquela época...

Você estava lá, e viu tudo,

Você era muito próxima de mim,

E agora tão distante,

Não pode deixar que eu lhe abrace,

Deixar que complete o carinho

Que nunca começou...

Sabe, é difícil viver com toda

Essas marcas nas costas,

É difícil não estranharem esse

Jeito de olhar as coisas,

De sentir o mundo,

De ser sentido pelo mundo,

Essa forma de silenciar,

Esse despegamento do todo,

Essa vontade de ser só,

De ir para longe,

E voltar quando todos tiverem partido...

As pessoas estranham,

Elas não podem conhecer a profundidade

De nosso silêncio,

Da distância que há entre nós,

Da nossa história

E de nosso amor...

E eu?

Tão diferente de tudo aquilo,

Olha pra mim,

A pouca coisa que sou,

É mais que qualquer coisa boa

Que imaginaram que eu pudesse ser...

Tudo me é tão estranho,

É tão estranho não ter a quem falar

Isso que estou pensando,

Que eu penso quando estou falando

Para aquelas pessoas

Que não vêem mais em mim

Alguém completamente mendigo,

Não estendem mais o braço

Para dar-me uma moeda,

Ou meio pacote de bolachas....

O que faço aqui?

Eu me pergunto enquanto vou

Escrevendo os tópicos de uma teoria,

E me viro e não sei...

Nessas horas

Tenho muita vontade

De voltar para casa,

Não essa que tenho agora,

Mas aquela em que vivia,

Onde podia ver sua irmã,

Que sempre me fazia um carinho,

Me chamava de querido e tudo...

E aí então eu deixava minhas coisas,

E ficava olhando a estrada

Na esperança, muito distante, de te ver...

Eu ficava imaginando que vinhas,

Que tua vontade de me ver

Fosse do tamanho da minha,

Que, mesmo depois de tantas dores,

Pudesse ainda haver um conto de fadas

Escondido,

Alguma coisa de fantasia,

Da qual ouvia falar,

Devia se revelar aos meus sentimentos...

Sim, talvez fosse você lá longe,

No fim da estrada,

Talvez fosse você que também me olhava,

Lá da distância do meu olhar,

Talvez fosse você que estivesse parado,

Que esperava algo,

Que também pensava, lá,

Na outra ponta da estrada...

Eu não realizei nada,

Nunca tive a mínima esperança que fosse verdadeira,

E você sabe bem por quê...

Eu fui vivendo,

Fui vendo o que havia

Ao dobrar da esquina,

Do outro lado do rio,

Após uma montanha,

Escondido no interior da pedra...

Eu fui vivendo aleatoriamente,

E se agora falo é sem saber

Mesmo como consegui não parar,

Como foi que me distanciei tanto?

Mas você,

Que talvez me conheça melhor que eu,

Pode entender tudo isso,

Possa desvendar o mistério disso tudo,

E isso faz com que eu sinta sua falta,

A falta que nuca foi preenchida,

A falta que sempre foi falta

Me faz perceber que eu

Queria muito que você estivesse aqui...

Talvez apenas para silenciar

Talvez apenas para partir novamente

Talvez apenas para me indicar a estrada,

Um rumo para olhar

E assim reinventar as lembranças que tenho,

A falsa esperança de que um dia

Você possa realmente aparecer

Na estrada e se mostrar

E falar as frases que jamais foram ditas,

E me amar

Me amar com o amor

Que apenas você poderia me dar...

Nesse dia,

Nesse dia de ausências acumuladas,

Eu queria muito que você estivesse aqui...

Queria muito não me sentir tão estranho,

Pelo menos ligar,

Queria ter coragem para dizer

As palavras que jamais existiram,

Eu queria sim...

Mas foi você quem me compôs,

E sendo assim

Bem sabes o que fizestes,

E em vez de eu ir e fazer o que

Todo mundo faz,

Eu sigo no outro sentido,

E enquanto muitos estão vindo,

Eu estou partindo,

Partindo,

Partido,

Perdido,

Com uma imensa vontade de olhar,

Acostumado a desejar muito,

Completamente,

Um abraço apertado...

Eu aprendi muito,

Sem querer nada disso,

Me Resignei a não receber nada,

Ou quase nada...

Apenas isto,

O Silêncio no olhar.

Sebastião Alves da Silva
Enviado por Sebastião Alves da Silva em 14/05/2006
Reeditado em 14/07/2006
Código do texto: T155942
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