Sem pena

Tão famigerado botão de flor verde esperança,

na roda dos tempos te tomaram em nome da vida,

te falaram, escutaram desde criança,

e logo vieste afagar a alma amiga;

Pena que na inocência da manhã, doce e orvalhada,

ainda seja botão e não rosácea,

que no pensamento novo e renovado

erga teu palácio, doce falácia;

Pena que na tarde em rubro hélio, lhe levante a face,

que no vento, a brisa campestre lhe abra as pétalas,

que o tempo lhe traga na mocidade

a ilusão de incertezas certas;

No crepúsculo se abre botão delicado,

e mostra seus dentes, carnívoro ser,

um falso ídolo que caça sempre parado

se alimenta de sangue, novo do viver;

Penetra em peito inocente, enraíza e tenta

e a noite cai, e o vento morre,

e a flor se vai, e o tempo corre,

e te esquece a noite, o crepúsculo, a brisa que venta,

flor que come a alma e lhe cospe a pena.