Do rubro ao cinza

(A amaria ainda que a plena miséria de sentimento me roubasse a alma

E se partisse, em sua ausência, amaria a intuição da sua existência)

Mas quando (recuado)

Lhe pedi (contrariado)

Para abandonar minha vida

Não pronunciou protesto, não hasteou bandeiras

Quando partiu e quando lamentei em calado pranto

Quando não voltou e quando esfaqueei minha esperança

Quando procurei por sua essência e quando não a encontrei

Quando, na certeza de que não retornaria, amei mulheres pequenas preenchidas de meras massas sem seiva

Quando tive de engolir martírios a fim de livrar o meu espírito da ávida esquizofrenia do amor sem vida

Quando surpreendentemente regressou e quando, na tentativa de amar mais uma vez, falhou

Quando, à noite, invade-me o sonho, me tentado ao oferecer parte do cálice do mais rubro e intenso vinho

Quando toca em meu corpo proporcionando-me atroz delírio

Quando nosso sangue ferve em fogo brando e quando a tenho comigo por alguns instantes

Quando seu calor me embrutece os membros e quando seu beijo cala o meu receio

Quando desperto em desesperada ausência de seu cheiro e quando volto ao luto por sua negra falta

Quando permaneço aqui, reinventando o tempo

Quando a noite chega e traz-me sonhos

(Mas como tocar o que é mistério?)

Quando o rubro definha em cinza

Quando o vendaval converte-se em brisa

Eu fico aqui a te amar incrivelmente mais, amor desvairado

É nessa hora que eu te amo mais

Chana de Moura
Enviado por Chana de Moura em 22/06/2009
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