ESTOU NUM BECO ESCURO. TOCA UM BLUES

Você é precisa

Sem você já não sirvo

sou servo

sem você eu não vivo tranquilo

sem você eu não peso um quilo

menos 11 gramas

fico sem alma sem piso

Se você não me toma

não me soma

eu vou subtraindo-me e assim despenco no nada

viro vento

poeira soprada/ inútil/ pleonasmo

metáfora de nada é nenhum

me acabo

escasso/ pouco

o resto que restou do resto da feira

Se você não me escreve

não me liga/ não conecta

fico sem meta/ sem verso

no inverso/ contramão

hiato

uma consoante sem vogal

ilegível/ intratável/ impronunciável

Se você não me soma

vou subtraindo-me

até sumir na paisagem

mero pardal na praça

cantando a esmo

viro lagartixa

destas que se joga na parede

taturana no casulo/ sem asas/ lesma

um risco no escuro

Se você não não me leva

resgata-me daqui

e me põe nos teus verbos e letras

nos teus contos e rimas

fico feito lima roendo unhas

sem dedos/ sem mãos

Se você não me anexa a ti

não me grampeia ao teu peito

fico papel avulso

sem nada escrito

rascunho/ no sub-uso

parafuso/ pra dentro contido

não digo nada/ não canto

figurante num filme mudo

ao passant

na ponta / não conta

Se você não me compra

e leva

fico na prateleira

no desconto/ liquidação

produto vencido

fico na rua jogado

dando volta em volta do umbigo

fico ferido

e por mais que ande não chego

não vou a lugar nenhum

Se você não me quer

fico oferecido

dando mole

rabo de saia

sujeito à qualquer

se você não quiser ser minha

eu fico assim solto

a quem me queira

vagabundo

Agora

Se você me toma/ de repente

de assalto

vou com sede /quebro o pote

apressado como cru

esfolo a boca no quente

tomo-te no colo/ te deito no solo

e com permisso

te faço minha/ a tal

aquela/ a prima

a rima perfeita/ versos e o poema inteiro

mulher