EM NOME DO AMOR
As vezes quero dizer uma coisa que impressione,
que emocione pelos olhos quem se dá ao tempo de ler,
e as palavras escapam pela porteira que deixei aberto,
saem pelo mundo e dizem coisas que eu queria dizer,
e fico só como uma estrela que da galáxia se perdeu,
um cisco que espera o vento para seguir em frente,
um poema de curta duração dito por entre os dentes,
claro e escuro, cheio e vazio como eu...
As vezes chego em casa e vou para a oficina nos fundos,
onde lavo meu corpo cheio de sons e ruidos do mundo,
abro meu peito e coloco meu coração na bancada,
deixo-o descansar de tantos sentimentos por nada,
lavo-o, deixo-o brilhando, escuto sua canção ritmada,
percebo que anda um pouco triste por só estar,
como um anjo que voa ao redor sem nunca chegar,
devolvo-o ao cofre onde mora e viverá para um sempre,
só assim sinto que, por me amar como ama o amor, está contente...
No meio do mundo eu paro e peço que cantem uma canção:
A voz do negro, a voz do branco, a voz de todas as cores
não é diferente da voz minha e da sua que escuto agora:
De seus olhos sai o cântico de sua mais bela aurora,
escuto o ranger dos músculos da canção secreta,
ouço vir vindo do ninho de palavras sua voz de poeta,
digo à máquina que é hora de escutar o que o homem tem a dizer,
o que ele necessita para o mal entendido desfazer,
e alguém grita lá do meio da multidão, com calma e furor:
ainda que seja difícil crer quando não há nada para isso,
ainda que a antiga fé tenha perdido o seu viço,
é preciso seguir em frente em nome do amor.