A BANAL HISTÓRIA DE ELIETE

Filha do rei, fechei os portões do castelo,

na ânsia de que algum príncipe se deslocasse

de além-mar, além-montanha, além-mundo,

e viesse me resgatar com um beijo nos lábios frios.

Fingia-me de morta, bela adormecida,

branca de neve, em alta torre,

e arrancava as folhinhas do calendário,

aguardando o instante em que o cavaleiro amado

apearia da cavalgadura e empurraria

os pesados portões e entraria e me veria

inteira, intacta, insone

a esperar pelos dias de amor e sossego.

Por dias, semanas, meses, anos,

esperei em vão o meu sonhado príncipe.

Este não veio e nem sequer enviou

um vassalo, um ordenança, um servo.

Não veio ninguém, homem algum, nenhuma alma.

Sedenta continuava, por trás dos portões,

e o meu rosto mudava nos espelhos.

Em que ponto meu sonho falhava?

Perguntava aos poetas do reino

e eles silenciavam, sem entender

por que meu desejo não se realizava.

Um dia, abri os portões, para ver se, na estrada,

havia, ao menos, a sombra da ideia de um príncipe,

e os esqueci abertos.

E alguém entrou: um homem estranho,

de hálito forte, de músculos rijos

e nenhuma nobreza.

Não tinha nada de beleza e candura,

mas, talvez por eu estar fragilizada,

me seduziu.

Da mesma forma que entrou,

o homem saiu.

Não deixou endereço, presente, nome,

só a certeza de que o amor

é uma dádiva para poucos.

Decidi deixar o castelo e sair à procura

desse homem, que havia me feito acordar.

Estranhei o mundo que vi.

Assustei-me com o tempo e a dor.

E, na busca incessante e infrutífera,

esqueci para onde voltar.

Hoje caminho sozinha.

Deito com outros homens, mas

há em mim um pouco de saudade

de quando era iludida,

e esperava o príncipe, de cuja existência

só consigo duvidar.

Meu nome é outro.

Está na página de acompanhantes

dos classificados

de um jornal de meu reino.