O Amor É-Terno - Homenagem à Vinicius de Moraes

Para Jania Cordeiro

O amor não vem do coração ou só do corpo

e quando chega, quase sempre de mansinho,

logo transtorna, quando o fogo nos domina.

Então esquecemos que só dói, quando termina,

já que o desejo não permite que se veja

algo mais além do corpo em turbilhão.

Todos sabemos o que sente todo o corpo

onde entre as pernas todo o aroma se concentra

e vive a festa e a alegria enquanto dura.

Não se constrói com frases-feitas ou com flores;

nem a beleza natural ou o dinheiro

podem achar, sem confusão, melhor caminho

pra conseguir que o coração lhe abra as pernas.

Pode ser nuvem, um abraço afetuoso,

mas que não passa, pois não é chuva de verão.

Ou então é um furacão que nos devora

e nos envolve nos lençóis e nos confunde

até fazer que tudo o mais seja banal.

Porém a vida passa e aí nem tudo é festa

e para o amor restam apenas horas vagas,

sobras da noite, ou até sombras dos muros,

para quem tenta se esconder dos que não amam.

Mas cedo ou tarde logo acabam descobrindo

que não se pode amar assim sem sofrer danos

dos mal-amados que vão sempre achar pretexto

pra falar mal e ver defeitos nos amantes.

Mas mesmo assim se vive bem, quando se ama

e pode logo se esconder num shangri-lá

onde ninguém possa achar o endereço

e que o amor seja um sonho eternamente.

Porém um dia o sonho acaba e despertamos

e então começam logo as noites maldormidas,

os pesadelos e as dores de cabeça,

pois as intrigas são agora nuvens negras,

que dormem junto do casal e permanecem,

como um câncer corroendo e destruindo.

E o coração, antes aberto e conseqüente,

logo endurece, fica frio ou sangra muito.

Na confusão, o outro, antes tão distante,

logo retorna e entre os dois quer se instalar,

roubando a cena e esperando o fim da festa.

Mas se o amor acabou mesmo e não tem jeito,

de nada vale desejar voltar atrás,

já que o retorno vira sempre um pesadelo.

Resta apenas esperar por novo vento,

que nos carregue em outra nuvem de alegria

e desejando que não seja passageira

e que o sonho seja terno enquanto dure.

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1) Publicado em "O Diário" - Coluna Literária de Marisa Fillet Bueloni - 05/ABR/1987 - Piracicaba (SP)

2) Publicado em "O Bonde" - Nº 3 - Rio de Janeiro (RJ).

3) Publicado em "O Vale do Aço" - 9 a 15/05/1987 - Cel. Fabriciano (MG).

4) Publicado no livro "Libertas quae sera tamen ou Escravo, Portanto Escrevo" - Ribro Arte Ed. - Rio de Janeiro - 1987 - pp. 38-40.

5) Publicado em "Poesias ao Sabor do Vento" - http://www.bchicomendes.com/dcarrara/amortern.htm