Mar dos olhos

Mar dos olhos

Quando me tocas

Com essas mãos

Molhadas

De sabor a mar

Sensíveis, salgadas

Eu me espanto!

Na doçura do teu olhar

Reflectido nas pupilas

Adivinho o quanto

Tu choraste

Ansiaste

Para me abraçar

O que sofres, é sempre passado.

Quando nos meus braços te abandonas

solicitas-me desejo. Único momento,

quando em ti me afogo, não sou, não somos

desejo ou saudade, apenas espírito leviano

que nos corpos aportou.

Nada me dizes,

consumada a transcendência,

Do que te invade no dia e na noite,

Quando não estou.

O espírito foi-se

Procura outra alquimia

Mais mundana e vil

No vento dos sussurros

Na cidade inquieta, adormecida

Pelos medos soturnos

Da própria existência ferida.

Mas teus olhos não abandonam

a vidraça da janela, que é fria e quebrável.

Junto dela, esperas que a noite se rasgue no ventre do dia.

Que o verbo regresse e esconda em ti a apatia

O verso descrito nos límpidos lençóis

Inócua promessa de que um dia

Todos, seremos apenas dois

Na fogueira da noite fria

Nada existe depois.

Depois… bem, depois

Somos madrugadas…

Quando me tocas

Com tuas mãos

Molhadas

Das lágrimas de mar

Ternas, salgadas

Eu, ainda me espanto!