O dom da felicidade
Houve uma ocasião em que da minha varanda se via
Uma paisagem que parecia ser feita de ilusão.
Próximo à varanda havia uns arbustos.
Era um período de seca, de solo endurecido,
Cujas plantas pareciam quase mortas.
Mas todo dia vinha um garoto com uma cuia, e, calado,
Ia jogando com os dedos água sobre arbustos.
Não se tratava de uma irrigação: era um tipo de borrifado cerimonial,
Para que os arbustos não se extinguissem.
E eu observava os arbustos, as pessoas, o chuviscos
Que caíam dos dedos daquele menino
E eu me sentia repleto de felicidade.
Às vezes chego na varanda e vejo os arbustos
Abrindo-se em flores.
Às vezes vejo nuvens compactas encobrindo o céu
Crianças felizes dirigindo-se à escola.
Pardais, um a um, que pulam de uma árvore para a outra.
Gato que pisca os olhos, imaginando, num só bote,
Surpreender os pardais, raias-manteiga coloridas,
Em pares, assim como cogitadas no espelho da atmosfera.
Ouço, às vezes, um galo que no terreiro canta.
Vejo, às vezes, um avião que nas alturas passa.
A mim, tudo me parece perfeito, no lugar certo,
Cumprindo sua missão. E eu me sinto cheio de felicidade.
Mas, quando digo algo sobre essa tal felicidade,
À frente de cada varanda tem gente que responde
Dizendo que isso não existe, outras dizem que só existe
Olhando de minha varanda, e outras, por fim, dizem que é preciso
Aprender a olhar, para vê-las assim.