AMORES IDOS E OUTROS DESESPEROS

Textos que estavam esparços por aí, há tempo, e que concentro aqui. Amores, tramas e enredos.

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VOCÊ PODE, VOCÊ É FORTE

Na segunda te amo. Na sexta você some

Na quinta aflito me toco do perigo

Dois dias é muito espaço

É uma largo risco

Um abismo sem ponte

É preciso muita calma nesta hora ou tudo explode

A ponte desaba e o rio leva

Você pode segurar a onda, eu sei.

Você pode ficar sem samba sem rock.

Nem praia, nem Woodstock

Só vento nos teus cabelos lindos

Sorriso sem choro

Criança e preguiça é tudo, é o bom. Rejuvenesce

Cuidado com a brisa do mar

A água é fria

Cuidado com o excesso ou a ressaca virá brava

Amarga

Que a segunda-feira seja sempre doce.

E a semana toda boa. Inteira sempre te espero

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NÃO VÁ SAINDO DE LEVE

Não vá saindo de leve

Fazendo de conta que não é comigo

Que tudo está resolvido

Que o telefone que atende

É só um amigo

Não quero mais te compreender

Todo mundo vê

Que você ainda se ata

Ainda se prende nas velhas amarras

Que ainda se agarra ao velho amor

Aquele de deixou você na rua

Na amargura

A dura da vida não fez efeito

Você não tem jeito

Não vá saindo de leve

Falando andando ao telefone

Não disfarce mais

Pelo menos na minha frente

Isso é evidente

Pra mim é tudo uma trama

Desencane. Já esqueci o que disse ontem

De se atirar no alto

De jogar pedras no telhado

Pintar os cabelos de vermelho

Pra você mando um aviso:

Não estou mais na tua

Sei que você não é uma vadia

Qualquer nota

Mas pra mim chega

Estou noutra. Não te espero mais na esquina

Não fique no ponto

Não me espere no porto

Não vá àquela ponta

Desista. Apague. Delete. Eu não existo.

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QUANDO TUDO VIRA FISSURRA E ALARGA

O nosso mundo se fissurou

Pólo Norte

Como uma geleira foi rachando aos poucos

E se separou

Acho que teve muito

Teve tempo, vento, tesão.

Mas faltou uma coisa. Faltou amor

Hoje os destinos se partem

Cada um deixou um pouco de si

na parte que ficou

É claro que isso não é fácil

Não é arte. Não é poesia

Não rima

É um enredo que chegou ao fim

Um marfim que se desgastou

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NOSSO CASO NÃO É UM BOLERO

Nosso caso não é um bolero

Não tolero

Esse lero-lero

Mágoa que remói

Água de reuso

Pondo em risco

Nosso riso.

Não se desgoste

Não aposte

Tudo na dor

Não faça deste amor

Um trágico enredo

De mágoa

De vingança

Não faça do certo

O confuso

Do reto

Obtuso tormento

Não faça de um mau momento

Eterno tormento

Não se perca no caminho

Não abandone o aconchego

Se ache em meus braços

Se acabe em meus beijos

O nosso caso

Não tem nada de tango

É no máximo um samba-canção

De Cartola

Uma música romântica

De Bethânia

Uma canção sem tragédias

Sem mágoas

E nódoas no fim.

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NÃO SEI PRA ONDE FOI O AMOR

Não sei onde foi parar o nosso amor

Por mais que o procure

Que vá lá no fundo das gavetas

Que revire o livro de Neruda

E o releia dez vezes

Que ponha aquela música de novo

Não o vejo

Perdeu-se entre atritos do dia-a-dia

Nas palavras mal ditas

Nas não ditas

Nos silêncios intermináveis

Nas ofensas

Implicâncias

Nas ausências

Naquele negócio que fica

Quando tudo vai para o ralo

As contas

A velha bronca do sapato fora de lugar

A toalha molhada sobre a cama

É sempre estes pequenos dramas que importam

Que ganham cancha

Que engancham-nos aos cabides

Ao patrimônio

Que nos transformam em pequenos demônios uns para os outros

São os arroubos, os exageros nos xingos

São os pingos nos is

A falta de riso os pequenos martírios que viram torturas

É claro, nestes caso, o amor não brilha mais

Torna-se opaco

Fica num canto e uma hora vai pro lixo

Junto com as revistas velhas e as folhas caídas da árvore

E nem se percebe mais que um dia ali esteve

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QUANDO O AMOR VIRA ÁGUA

Quando o amor vira água

Quando o amor acaba

Racha

Não há cola que ligue

Palavra que ate

O toque fica esquisito

O sexo mecânico

Tem gente que fica nessa

Conforma-se

E espera a vida passar pela porta

Tem gente que parte

Tem gente que mata

O certo ninguém sabe

Mas quando o nó desata

A sangria desanda

Pra não sobrar descaso

O certo é cada qual com sua parte

Estrada

O resto é tolerância

E nada tem a ver com entrega, troca.

Tudo virá água e vai. Seca

É nada

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QUANDO O AMOR DIZ QUE NÃO VOLTA

Quando o amor diz que não volta

O ontem já não importa

O dia novo amanheceu

Você ficou só no porta-retrato

um o sol que já morreu

Seu gosto na minha boca

Seu cheiro no meu paletó

Seu sexo no meu

Isso não tem volta

Agora não tem mais jeito

O ontem já não importa

Ao sair feche a porta

Não precisamos de adeus

As coisas são assim:

O abraço veio primeiro

O beijo, o sexo veio após

O desencontro, o desacerto... depois

Tudo é reflexo, apenas nossos erros

Coisas sem conserto

Tudo à minha volta

já amanheceu

O ontem é muito distante

Você ficou só no porta-retrato

Um sol que já morreu

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SEXO SEM A OUTRA PARTE

Estranho...

Sexo assim

Sem amor ou paixão

Fica faltando uma parte

Fica na superfície

Na amizade e tesão

Mas pode ser bom

Se cada qual

Souber

Que nada lhe cabe do outro

Estranho

Amor à distância

Sem pele, sem toque, sem carne

Fica assim

Fumaça sem fogo

Uma parte sem a outra

Boca sem boca

Mas pode ser bom

Tem gente que ache certo

E goste

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AMOR ANALFABETO

Aquela que gosto não me lê

Os amores que tenho

Os poemas que faço

Uma delas me lê, me acha fraco, mas gosta

Outra devora meus escritos, acha bonito, adora

Já aquela que tritura meu coração

Que me fascina e é motivo de todos eles

Coitada, nem sabe, analfabeta

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DORES DE AMORES

As dores de amores

Quando escancaram entranhas

Causam estranheza

Fazem-nos jogadores e joguetes

Atiram-se como aríetes

Contra as portas dos castelos da razão

É porque se acham as tais

Querem ter o domínio e a direção

Para tanto não economizam lágrimas

Querem sangue e ferem se preciso for

Tornam-se mesquinhos nossos sentimentos outros

Enfim é um engodo

Querem ganhar o jogo na emoção

Não caio neste engodo

Nestas frescuras do coração

Se a dor for aguda de fato ou se for fraca

O santo remédio é um só

Chama-se: Outra

Do contrário entre na dança

E sambe miudinho na frescura

No esmalte

Na superfície

E depois é só sair por ai rimando amor e dor

Isso já cansou a beleza

Nessa reza não ajoelho

Nessa igreja não comungo

Ainda mais eu que tenho o coração vagabundo

Cigano e ateu

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SÓ SEXO RESOLVE QUANDO TUDO DESANDA

Quando a bronca fixa-se

E fica tudo naquela de muita onda

marola

Quando a relação complica

E fica muito dito e não dito

Que nem a São Benedito se apela

Ou quando tudo silencia

Ninguém fala

Não há resposta

Sabe o que falta

E o que rola e resolve: Sexo

Daqueles em que ela resiste no começo

E se insiste e tenta de novo...

Logo tudo fica pele

E quer saber:

Assim fica mais gostoso

A palavra volta

Renova

Tudo novo de novo

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CASAMENTO NÃO TEM REFIL

Casamento teria que ter prazo de validade

No mínimo um refil de tolerância

Pra não ficar tudo vencido

Tormento, desconsideração

Por que, quando falta amor e cumplicidade,

sobra só a sociedade, o compromisso formal.

Quando a química se dilui

e a alquimia se esvai

são os compromissos que falam alto

Um veneno que mata e mata mais

Não sobra nada

Fora os frutos...

Só casa, móveis, quadros na parede e uma mala.