Cristina

Chegou junto com a primavera.

Montevidéu renascia daquele inverno.

Bateu na minha porta,

Vendendo seguros.

Meu regresso tinha sido feliz

Os amigos, os parentes,

Os anos transcorridos

Mas a euforia tinha acabado.

Eu não quero seguro,

Seguros a mim?

Seu cabelo negríssimo,

Sua pele bronzeada,

Sua bela boca úmida...

Outras peles, outras bocas,

Outros cabelos,

Desfilaram na minha mente.

O encontro foi no centro.

Ela pulou dentro do meu jipe

Com a alegria de seus vinte e dois anos.

Dirigi loucamente pelas ruas

Como se fossem outras ruas...

De outras cidades...

Embriagado de pátria,

Satisfeito de viver.

Ela contagiou-se comigo,

Mas viu minhas cicatrizes...

Perguntou-me, contei...

Entramos no lugar mais solitário,

Mais perto do mar, meu mar,

Brincamos na água,

Como crianças.

Rolamos na querida areia

Como crianças...

Como adultos.

Como adultos

Meus lábios encontraram os seus.

Como adultos

Nossos corpos se encontraram.

O sol da manhã foi testemunha

A querida areia foi o leito,

O vento foi carícia,

O ruído do mar foi o fundo

Dos suspiros, das juras;

Das promessas...

Do nosso amor.

E eu beijei seus cabelos

E ela beijou minhas cicatrizes

E eu senti alegria,

Senti, que estava em casa,

E me derramei por inteiro

Nas profundezas do seu corpo cálido,

E as areias trazidas pelo vento

Foram nos cobrindo com ternura.

Setembro, 1977.

Montevidéu.

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Páginas da Memória - Livro inédito.

Gabriel Solís
Enviado por Gabriel Solís em 13/06/2011
Código do texto: T3031233
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