Exaurir
O ar pesado adentra os pulmões.
E lhe imploro por um beijo, mas apenas o gosto seco do vazio preenche os lábios.
E não me contento com o pouco.
As horas passam.
Ainda permaneço no mesmo caminho, seguindo os trilhos, perseguindo a locomotiva, daquele jeito obscuro, contando passos e camuflando a dor.
É que não sei mesmo viver de mentiras. Então ensaio na carta um desabafo... Só ensaio, porque não há como expressar em palavras a dor.
E criei um jeito todo meu de sobrevier a isso: guardei comigo as palavras; desmontei as verdades; e preguei no rosto um sorriso, escancarado de orelha a orelha.
A cor da tua voz permanece tatuada em minha cabeça, e já nem preciso mais fechar os olhos para ouvi-la.
É que tenho me concentrado pouco ultimamente.
E não se preocupe, porque tudo permanece exatamente no mesmo lugar. Até eu! A única mudança é que já não espero mais pelo teu retorno. A sala grande e vazia, de moveis grandes e vazios, com aquele cheiro doce e vazio, preserva meu eu estático e sozinho.
Tá mesmo difícil manter o foco.
É que a felicidade não veio hoje, então me propus a escrever algo menos quente. Mas nada de palavras amargas, porque não é o desamor, também não é a verdade absoluta, é apenas meu hoje.
Apavorado continuo pelos trilhos, contando passos.
Um sol forte se esconde atrás da lua. É meio dia, e a luz, tímida e ofuscada, vela o caminho que agora é só meu.
E desconstruo verdades solidas e construídas.
Onde está o erro?
Novos passos e a luz, ainda opaca, intrínseca e insossa, conserva a dor.
Apenas continuo nos trilhos, por medo de desviar e me perder no caminho.
É que não sei todas as repostas.
Ainda estou nos trilhos.