TATEANDO / AGUARDANÇA
TATEANDO I (2006)
Não penses que é o desejo que me atrai:
Ele virá depois, ao menos acredito;
Neste momento agora, eu só me incito
A te tomar nos braços, como vai
Uma criança aos braços de seu pai,
Para te consolar, ao som bendito
Desse teu respirar, sem mais conflito
Desse outro sentimento que me trai.
Todavia, a falta é grande e tão sozinho
Eu me sinto nesta hora de emoção
Que não sei se nem nisto vou insistir...
Quem sabe se meu gozo é mais mesquinho?
Pois nesta noite de longa solidão,
É de teu lado que queria dormir...
TATEANDO II (7 dez 11)
Eu poderia aos deuses suplicar
Que interferissem nos páramos da vida,
Buscando bênção nos fundos escondida
Dessa jornada de tanto emaranhar...
Eu pediria aos deuses alcançar
A cornucópia da abundância perseguida,
Não por ouro ou alimento nessa lida,
Mas por amor nesses teus olhos contemplar.
Que só quisesses junto de mim ficar
E realmente nos meus braços ressonar,
Enquanto eu te vigiava, de olhar terso...
Que ao me veres, quisesses me abraçar
Até ao ponto de me ansiares sufocar
E me tomar dentro de ti, em parto inverso.
TATEANDO III
Contudo, caso os deuses me escutassem,
Não pediria deles a promessa
De que a teu lado os sonhos me embalassem,
Nem que eu assista enquanto ressonares...
O que eu suplicaria ganhar dessa
Vasta coorte de criaturas tutelares
É essa ânsia que jamais me cessa:
Que te livrasses desses teus penares...
Que essa angústia que te aperta o peito
E te leva a cometer tanta tolice
Se afastasse com um toque de condão;
E então, mesmo sem ter qualquer proveito,
De longe até, me alegraria quando visse
Nova doçura a palpitar teu coração...
AGUARDANÇA I
2006
por ti esperarei, por tanto tempo
quanto garanta o [e]terno sentimento
que despertaste em mim, inabalável,
nos séculos de outrora, num evento
que me fez rever em ti, num só momento,
de espantoso e total conhecimento,
aquela descoberta inexorável
que dentro em mim gravou-me tal portento:
o quanto para mim significavas,
embora perceber fosse também
que a seres minha, muito custarás;
de uma só vez, meu peito conquistavas
e o que eu serei, bem sei; mas tu, porém,
como posso saber o que serás?...
AGUARDANÇA II
10 DEZ 11
é natural que saiba só de mim:
é só o que tenho que conhecimento gera;
toda a memória de minha mente é mera
recordação do que me fez assim.
como saber o que te fez, enfim?
mas aquilo que se tem, como se espera?
pois só se espera aquilo que se queira
e o que se tem não se espera no outrossim.
o que se tem é qual cardume de alevins,
peixes brilhantes a nadar, feito cortina,
que se abre e se fecha sobre a mente,
às vezes clara, qual um toque de clarins,
mas de outras obscura, qual vagina
que se deseja, desesperadamente.
AGUARDANÇA III
e sem saber de ti, do que serás,
só posso para mim criar imagem,
que ao revestir com os véus de minha visagem,
será dentro de mim que te acharás;
e dentro assim de mim, o que farás
será somente o que anseio por miragem
e não te peço por falta de coragem,
mas que só de me fitar encontrarás,
que, realmente, te desejo minha,
mas não és tu que tenho, é tua figura,
que de certo, é de ti bem diferente
e então essa que imagino minha rainha
já está dentro de mim, qual fada pura,
por mais que isso que és se encontre ausente.