O veneno da flor
I
Não posso suportar a minha e a tua dor
Sinto corroer por dentro, a toxina, o licor
Nos teus lábios recebi afeto, mas um gosto amargo ficou
Um perfume embriagante, o veneno da flor.
Uma doce tormenta, um amargo padecer,
Carregando as suas lágrimas, levar sozinho o meu sofrer.
Uma mortal espera, a mais ferrenha solidão
Semblante carregado, um câncer no coração
Sorver o doce veneno, a ferida, o aguilhão,
Até não sentir mais nada,
A neblina,
A escuridão...
II
A tristeza melhora o rosto,
A amargura provoca aflição,
O amor tudo suporta,
Só não espera a traição.
Um ardente desejo,
Um vibrante torpor,
Uma chama incandescente,
Isso é luxúria ou amor?
Com os pés balançando na ponte,
Observando os carros passarem.
Meu dedo encosta o gatilho,
O que me impede de atirar?
Na cidade o som nunca para
Me lembrando que há vida lá fora,
No meu quarto tudo é fracasso,
Poeira, asco, escória.
Tentando tirar tudo a limpo,
Tentando esquecer este ensejo,
Tentando esquecer os seus beijos,
Tentando tirar da memória.
O poeta sangra a tinta,
Em ardor e em tormenta.
Tendo em si um amor febril,
Tendo em si toda a descrença,
Tendo em si essa doença,
Um amor implacável e infantil.
III
Sou escravo da bondade
Sou amigo da ilusão
Sou o amante que te aguarda
Sou a dor do coração.
Sou o espinho que te fere
Sou o perfume da flor
Não sou tudo o que sonhara
Mas sou mais do que pensou.
Sou o porto que te abarca
Solitário trovador,
Sou o medo que te afasta
Seu criado e seu senhor.
Sou aquele que rejeitas,
E a quem implora amor,
Sou o espelho da sua alma,
E quem padece sua dor.
IV
Que seja o castigo do meu pecado
Que seja a aurora e o desespero
Que seja a dor do meu riso
Que seja este o meu maior erro.
Se padeço com a realidade,
Prefiro a doce ilusão,
Prefiro as injúrias das línguas,
Do que o amargo do coração.
Prefiro ter o coração contrito,
Do que ter a razão.
É preciso sofrer e amar,
É preciso amar o sofrer,
É preciso confiar,
E a todo tempo descrer.
Amar é doar sua vida
Entrar no fogo pra se queimar,
O amor é uma cachoeira,
É a correnteza que te lança no mar.
Amar é esperar o afeto,
De quem sempre te maltratou,
O amor não rende vitórias,
Somente mágoas, injúrias e dor.
O amor não é egoísta,
Não é simplista ou vingador.
A amor cada vez mais escasso,
No meu coração transbordou.
O amor não se mede na Terra,
O amor é o reino de Deus.
Ele é sangue, suor e opróbrio,
É a graça que o mundo esqueceu.
O amor é a esperança que transcende,
O amor é uma cruz a se carregar,
O amor é a dor do poeta,
A doença que não se pode tratar.